UM PAÍS AO NORTE DO MUNDO

No segundo domingo de cada mês,

Ainda madrugada, tomava café em minha mesa sem toalha,

Depois, num ritual sem nenhum sentido, quebrava a xícara antiga,

Com desenhos renascentistas desbotados

E seguia viagem até um país ao norte do mundo,

Lugar, de mim, totalmente desconhecido.

Pelas janelas sujas do trem desconjuntado,

Observava a paisagem monótona e triste:

Bicicletas, homens e cavalos em estranha convivência,

Cada qual com um desejo insólito no olhar,

Dardos flamejantes, que mais pareciam relâmpagos distantes;

Fúrias contidas pelos limites afiados das cercas.

Quando o trem chegava à estação final,

Ainda ali não era o meu destino,

Sempre um pouco mais à frente,

Coisa de ano-luz à direita

De que vem dos lados da Lua,

Em noites de frio tão intenso,

Que dormimos de meias de lã,

Perdendo o senso e o raciocínio lógico

Acerca das flores que insistem em nascer

Nos beirais das casas abandonadas em solidão.

Sabe, acho que sonhei todas essas viagens;

E que os tickets dos bilhetes de terceira classe,

Conservados no fundo dos bolsos furados

De um paletó perdurado no armário do tempo,

Não passam de frutos da minha mais fantasiosa ilusão;

Que sequer existiram o trem e a paisagem,

Não passando, tudo, de um sonho imprestável,

Uma dessas coisas inúteis que insistimos em guardar

No fundo de gavetas trancadas à chave,

Destinadas a permanecer para sempre fechadas.

- por Hans Gustav Gaus, heterônimo de JL Semeador de Poesias –