UM POEMA-BOMBA
Um poema explodiu
dentro da minha cabeça.
Foi assim:
Eu estava sentado,
no ônibus 409,
voltando da Tijuca,
recitando, baixinho,
um poema de Pessoa
- Autopsicografia -
quando aconteceu.
De repente,
minha voz emudeceu,
a vista turvou-se,
o corpo, surpreendido,
em convulsões.
E antes que ele
- o poema -
se fosse,
deixando
apenas estilhaços
e fragmentos
de inspiração,
venci a paralisia
que de mim se apossara,
tomei da caneta,
sempre à mão,
em caso
de tais atentados,
e anotei-o
num papel esparso,
letra por letra,
palavra por palavra,
verso por verso,
apesar do balanço do coletivo,
e da vista confusa
quando escrevo em movimento.
Porém, vencidos
os percalços,
ei-lo, que surge,
à luz clara
da manhã do Estácio,
contemplando da janela
o muro que restou do presídio
e os belos seios
da moça que espera no ponto,
olhos brilhantes e perdidos,
a ignorar o meu olhar de pedido
e o poema-bomba explodido.
- por José Luiz de Sousa Santos, o JL Semeador, em 31/jul/2010, revisitado em 23/07/2013 –