POTE DE PRATA
Sentada no telhado, por cima das casas e ruas,
buscando, não as estrelas, nem tampouco a lua,
mas os anjos e sua Rainha, que por elas passeiam e dançam.
Sentada debaixo da noite, no chão,
esperando, não a escuridão, nem tampouco a febre da agitação,
mas a aurora boreal do silêncio contemplativo,
que se esconde dos dias cegos e incomunicativos.
Sentada no topo da torre de Babel,
fixando a atenção, não na confusão de línguas e divisões,
nem tampouco nas humanas arquiteturas e maquinações,
mas na língua original da Verdade e da pura Comunicação.
Sentada nos degraus dos palácios, tribunais e catedrais,
procurando, não encrencas, nem tampouco inúteis desafios,
mas a paz da oração e da consciência que sonha e questiona.
Sentada no sótão, junto do baú de cartas e fotografias,
abraçando, não as obsoletas quinquilharias,
nem tampouco o mofo de vidas ultrapassadas,
mas as histórias, heranças, lutas e gestos de gente
que jamais passará e que deixou as portas escancaradas.
Sentada nas salas e auditórios das universidades e escolas,
prestigiando, não os discursos e aulas obtusos com suas esmolas,
nem tampouco a ignorância e mesmice da maioria dos estudantes,
mas as raras e heróicas mentes sábias que conseguem resistir e ir adiante.
Sentada nas poltronas e cantos dos teatros, cinemas, galerias,
aplaudindo, não a fama, ou a opinião de críticos, ou os estrelismos,
nem tampouco tudo o que se vê e ouve no artístico mundo,
mas as asas que tocam e levam para horizontes mais profundos.
Sentada nas janelas das prisões e dos hospitais,
Tentando olhar, não para as injustiças do planeta e suas feridas mortais,nem tampouco para o sórdido reinado da estupidez e violência,
mas para o significado do despojamento e da solidariedade e clemência
quando e onde menos se espera.
Sentada nas prateleiras e corredores das bibliotecas, sebos, livrarias,
perseguindo, não as páginas que nada dizem e não se apreciam,
nem tampouco o intelectualismo sofístico e pomposo,
mas o pensamento e a emoção do conhecimento valioso,
o prazer das palavras preciosas e suas elocubrações
o diálogo da amizade que ameniza as solidões.
Sentada nos galhos das árvores outonais,
desejando, não as paixões acaloradas e seus punhais,
nem tampouco o frio do inverno inabalável
ou a primavera colorida e agradável,
mas o pote do fim do arco-íris, que é de prata.
Pote no qual se encontra o mágico mapa.
Mapa que leva às Mãos Divinas –
onde pretende sentar livre e aconchegantemente –
pelo resto de seus eternos dias.