MOINHO

eu não vivo de mentiras

eu vivo de mentir

que tudo que é estático, reto, rotina

me anima mais que o nostálgico

o improviso, o riso, a poesia.

deixei um ano para trás, mais um

e os amores que amei neste tempo

e os desejos que não confessei

e os pecados que não cometi com o corpo

- minha alma e meu pensamento vão arder em fogo eterno

creio na ressurreição da carne, ou não entrarei no reino dos céus.

será assim a eternidade?

um corpo oco, de carne apodrecida, rejuvenescida

sem utilidade, apartado

da alma carente, do sentimento lascivo

que queimam sem ardor?

não sei qual a mentira maior em que se pode crer

qual o argumento fatal que nos impede o fazer,

viver é viver, um transitivo direto

sonho amor, ganho dinheiro

meu bem, meus bens

tudo o que construí me consome,

algum coreto sob as estrelas

alguma magia, ouvi-las

alguma poesia...

tenho um ano pela frente

para quê, meu deus?

para quê? não me responda

você não conhece a resposta

o espelho sabe, mas não fala

vou-me embora, esconder-me de mim

não sou eu quem chora,

é o mundo, esta mentira tola

em que acredito.

ah, o amor, tanto amor

que o romântico planta

e a vida com sua pedra de mó

tritura, e nos alimenta

de realidade

esta verdade absoluta.

os sonhadores do absoluto?

outra mentira que sonhei,

eu vivo de mentir...