RAIVA NOS DENTES

Raiva.

É esta raiva,

Que não me deixa descanso,

E consome fundo,

Que calada, pé ante pé,

Me leva a vontade,

Para onde já não a alcanço.

Raiva...

Ó amor esquecido!

E é nesta defesa,

Há tanto tempo estabelecida,

Por entre palavras e falsas conjecturas,

Que nasce o meu desdém,

Pelo seu toque sereno, e me deixa quedo,

Por sobre o plano da mesa.

Raiva.

E eu grito raiva,

Querendo exaltar o amor.

Raiva,

Porque me falta a coragem.

E esta armadura, que me magoa,

Não é peça de artesanato,

Parada e muda a um canto poeirento,

É carne abusada e estropiada,

São nervos que me são superiores,

Gritando como que por uma outra

Libertação...

Ai raiva!

Por não ter raiva suficiente,

E olhar para isto tudo,

Com uma indiferença inquietante.

Mas se eu pudesse...

Se eu pudesse chamaria o amor.

Se eu pudesse seria

Uma pessoa normal,

Com tudo o que há de normal,

Em ser-se feliz e pobre de espírito.

Seria feliz e casava.

Seria feliz por ter a carne

Da minha própria carne,

E por ter uma profissão.

E à noite, sentado

No meu harém caseiro,

Sentir-me-ia realizado por tão pouco.

Ah! Não acreditem no que escrevo!

Raiva... Ter raiva desgasta.

Ter amor é-me um esforço

Que não quero.

Ser feliz é contrariar a sorte.

E ser normal, como tudo tão igual,

É uma náusea que dispenso.

Ai raiva, para isso tudo!

E p’ra esta coisa a quem chamam de vida.

Bip-bip-bip-bip… Interjeição!!!

Ai, se eu retivesse, em minhas mãos,

Os meus intentos nocturnos...!

Se eu me detivesse...

Outra vez, esta melancolia,

De dias talvez felizes,

Me vem à lembrança;

Outra vez, este romantismo,

Da criança que já fui,

Me invade;

E dentro destas quatro paredes,

De azul-agressivo pintadas,

Há vidas efémeras,

Como golpes fracos de asas.

Seco, seco, seco...

Frio, frio, frio...

Isto para nada me serve!

Isto...

Ó tormentos!!!

Jorge Humberto

(21:29/Maio/12/03)

In "Saiu a Fera de Mim"

Jorge Humberto
Enviado por Jorge Humberto em 07/09/2011
Código do texto: T3206196
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