" MEMORIAL DE CARMELA" (Carmela: o "alter ego" de Adélia Prado.)
Carmela menina magra, vivia de teimosa,
criança é sempre criança, tem fome
de transcendência: improvisa, pinta, desmonta,
vira do avesso. O céu tem que ser
como o quintal de sua casa: com ribeirão, horta,
o balanço do abacateiro, o gato ladrão,
o sabiá da romãzeira, sem dispensar o sapo amarelo.
Brinquedos? Só os de ferro feitos pelo seu pai,
eles duram toda a vida...
Infância tem sempre a porta aberta,
para falar com as núvens, com os passarinhos.
A casa da família é pequena e pobre,
cruz que se carrega com devoção!
Ninguém repara em Carmela, que chora
quando as flores murcham.
Ah! Carmela! Da roseira vai brotar um carmim intenso,
virá com perfume de setembro na primavera
e Adélia chegará! Os cinamomos continuarão
floridos em seu postigo, e de sua alma vai brotar
A vida! A vida! A vida!, só porque
retornará um setembro na primavera!