MEIO-TOM


O "trailer" despediu-se súbita
e inesperadamente.

O amor - embrião - formava-se em meu ser.
Não podia abortá-lo.
E foi tomando forma. Nasceu
o sentimento imenso sem ter onde morar.

Encontrou um coração - porta entreaberta -
medroso, indeciso, orgulhoso.
Meu amor infante, órfão, carente,
abrigou-se.
Precisava de um lar.

Posseiro foi ficando, se acostumando
às paredes frias, aos cômodos vazios.
Mas continuava só, morando, só,
sem ter com quem falar.
Passou por crises na adolescência
e cresceu. Mais do que seu próprio lar.
Amadureceu. Ficou adulto.
O coração já não o podia comportar.

Saiu. Rumo à vida. Sem destino.
Meio sem jeito, meio perdido.
Entrou em outros corações assim, por entrar,
e saiu deles sem se despedir.
Voltou a caminhar.

Cansado, sentou-se à beira da estrada
sem nada esperar.
Resistindo aos ventos e à chuva,
se fortaleceu.
O meu amor maduro aprendeu a amar.

Quando deitou-se para sonhar, não conseguiu.
Olhos abertos. Vigilantes. Escudados.
Alerto para o silêncio
e para quem chegasse.

Mas, num cochilar,
não pôde fugir do "trailer" que voltou
aconchegante, carinhoso, hospitaleiro,
que abriu-lhe as portas, lhe mandando entrar.



E ele entrou. Ficou.
Recomeçou.

Leuri Lyra
Enviado por Leuri Lyra em 12/10/2010
Código do texto: T2552746
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