Tem um dia em que tudo é assim,
a história estorva, a retórica cansa,
a amizade é nula, a esperança nada é.
 
Todavia, todo dia tem um sol, e enquanto
houver luz, haverá um sorriso que brilha,
um pássaro que voa, uma cor que destoa.
 
Todo dia, tem também uma noite,
sem sons, sem sonhos, sem companhia,
 
aos amantes, as amadas
aos crentes, os deuses
aos loucos, a lua
aos ébrios, o conforto etílico
aos poetas, a dor.
 
Giram as rodas do mundo,
os ventos constroem a ilusão,
os olhos de mel, quando apenas
lembrança, exalam o fel;
 
este destino errante que construo
a todo instante sem ser feliz,
sem ser ausente, sem ser importante,
sou apenas o vazio, o sem deus,
o sempre adeus, sou apenas vadio.
 
Tenho um amor, tenho amanhã outro dia,
tenho este jeito lúdico à vida, esta vida
em busca do absoluto, esta absoluta
necessidade de viver,
 
mas agora, nesta hora tardia, no vazante
deste dia, há esta emoção triste, esta
solidão
que acompanha, esta dor, esta lágrima,

este poema desesperado, este desespero mudo,
mas não mudo, sou sempre só.