Filha de índia com preto
Sou filha de preto com índia
Nasci assim meio sem jeito
Talvez quem sabe
Por que a índia que me pariu
Deu-me ao nascer
Abdicou ao ofício de mãe
Não tinha a pobre, meios para me criar
Quando chegou o dia, quando as dores surgiram
Foi levada para casa
De uma famíla, que muito me queria
Nasci naquela casa, ali fui criada
Mas desde pequena
Uma coisa me intrigava
Como pode minha pele ser tão escura
Se meus pais são brancos?
Isto sem contar
Maldosos comentários
O José, como pode sua filha
Ter cor de café?
Desconversava seu José
Acontece,que a verdade,sempre aparece
Descobri depois de grande
Minha história real
Após muito ponderar
Concluí afinal
Estas coisas de sangue
Na verdade pouca importância têm
O que manda, é o amor
De quem me criou
Amor em sua forma mais plena
Amor sem proporção
Fui mesmo assim atrás da índia
Depois de muito procurar
Encontrei a mulher
Vivendo de favor, num barraco da favela
Ao me ver, abraçou-me
Senti um misto de sentimentos
Mas o maior de todos
Foi de vivênciar a tristeza
De uma mãe, que por necessidade
Falta de tudo
Precisou abrir mão
De um filho do coração
Hoje não sei mais nada sobre ela
Nos perdemos no espaço
Mas sempre que vejo uma índia de cabelos negros
Lembro daquela pobre mulher
Meu genitor, sequer conheci
Disse a índia, que sumiu por aí!
Por vezes é estranho
Paro em frente ao espelho
E procuro identidade
Estranha, esta sensação, de saber que foi dada
Mas, ingrata não sou
Agradeço o tal gesto
Afinal, se não fosse pelo mesmo
Quem sabe, não teria o que escrever
Agradeço ao Grande Manipulador
Por ter-me feito este favor
Colocar-me assim sem jeito
Dentro de uma outra história
E sigo então
Neste mundo de meu Deus
Apenas registrando, fazendo releituras
De minhas vivências e do mundo!