Filha de índia com preto

Sou filha de preto com índia

Nasci assim meio sem jeito

Talvez quem sabe

Por que a índia que me pariu

Deu-me ao nascer

Abdicou ao ofício de mãe

Não tinha a pobre, meios para me criar

Quando chegou o dia, quando as dores surgiram

Foi levada para casa

De uma famíla, que muito me queria

Nasci naquela casa, ali fui criada

Mas desde pequena

Uma coisa me intrigava

Como pode minha pele ser tão escura

Se meus pais são brancos?

Isto sem contar

Maldosos comentários

O José, como pode sua filha

Ter cor de café?

Desconversava seu José

Acontece,que a verdade,sempre aparece

Descobri depois de grande

Minha história real

Após muito ponderar

Concluí afinal

Estas coisas de sangue

Na verdade pouca importância têm

O que manda, é o amor

De quem me criou

Amor em sua forma mais plena

Amor sem proporção

Fui mesmo assim atrás da índia

Depois de muito procurar

Encontrei a mulher

Vivendo de favor, num barraco da favela

Ao me ver, abraçou-me

Senti um misto de sentimentos

Mas o maior de todos

Foi de vivênciar a tristeza

De uma mãe, que por necessidade

Falta de tudo

Precisou abrir mão

De um filho do coração

Hoje não sei mais nada sobre ela

Nos perdemos no espaço

Mas sempre que vejo uma índia de cabelos negros

Lembro daquela pobre mulher

Meu genitor, sequer conheci

Disse a índia, que sumiu por aí!

Por vezes é estranho

Paro em frente ao espelho

E procuro identidade

Estranha, esta sensação, de saber que foi dada

Mas, ingrata não sou

Agradeço o tal gesto

Afinal, se não fosse pelo mesmo

Quem sabe, não teria o que escrever

Agradeço ao Grande Manipulador

Por ter-me feito este favor

Colocar-me assim sem jeito

Dentro de uma outra história

E sigo então

Neste mundo de meu Deus

Apenas registrando, fazendo releituras

De minhas vivências e do mundo!

Julia Lopes Ramos
Enviado por Julia Lopes Ramos em 16/01/2009
Reeditado em 16/01/2009
Código do texto: T1388309
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