Horas tardias

Sabe, de tudo, quase nada pode ser

E eu estou cheio de nada

O vento me levando

Como um estatua de pólen que se vai

Nas invisíveis asas do tempo

E do vento

Assim, como se não se existisse mais...

Lembro da primeira vez

Que fui surpreendido

Pelo que me fez cansar

De buscar

E lembro-me ainda

De ter jurado em tenra idade ainda

Que ficaria atento

Muito atento

A esperá-lo chegar novamente,

E fiz estudo avançados

De modo que

De longe

Eu o reconheceria

E me prepararia

E salvaria meu coração...

Mas

Aprendi

Com as almas silenciosas

E anciãs

Que passam em meu paralelo

Tem coisas de impossível salvação...

Eis me aqui então

Já velho e experimentando

Sem serventia

A não ser

Para a sublimação

Desse e nesse tempo

De aqui de onde vivo...

Não posso dizer que aprendi tudo

Nem ter certeza

De que quero aprender mais alguma coisa

A mim talvez a ilusão

Que o sol nos causa

A mim principalmente

Fosse suficiente agora

Nessas horas lentas

Em que a poeira sobe facilmente

E procura olhos que a acolham...

O que baila nos interstícios dos mundos

Fervilhando sob essa alta temperatura

Pode ser apenas umas miragens

De quem tem muita sede

E já cozinha entre as arvores queimadas

Pode ser apenas miragem

Devo confessar que tudo isso tem me cansado muito

E que as vezes nem sempre o que vejo

Apenas por que vejo

Deva de fato existir

Essas possíveis miragens

Também pode ser

O que não pôde ser

E agora tudo se nos revela

Por que somos sonhadores

E, com carga esmagadora dos anos,

E de tudo que se lhes vive

E de tudo que se lhes não esquece

E de tudo que se lhes esconde

E de tudo que se...

A cérebro vai cansando

E a memória assim ficando difícil

E as cores dizendo adeus...

Então é que toda sombra nos parece um palácio

E qualquer lugar um lar

E nos olhos o peso gigante

Apenas é vencido assim

Com essa demonstração

A nós,

eu e mins,

nós quase todos,

sim, por que uma parte de nós já é morta

e em segredo enterramos nos corações das madrugadas

em silencio

sim, em segredo, sim...

uma parte de nós

se enfilou junto às almas silenciosas

e nos disseram palavras de despedida

palavras tão doídas

que nos levizou para sempre

e sempre fomos

com o cair das horas extremas

ficando mais e mais leves

e agora aqui estamos

olhando para os nossos

um dia sonhados sonhos

agora

nosso único interesse

quiçá a única coisa que os olhos

toneladizados podem querer

ter vontade de ter força para abrirem-se

ainda uma única vez

e que assim se põem eternamente

enquanto o sol nos desfaz por aqui

e nos restos assim sublimados

por ventos e tempos levados

átimo a átimo

a nos completar

ali em nossa frente

no baile metametafisico

dos nossos eus

dos nossos morridos sonhos

mas em segredo

e em mapeados lugares

que só nos sabemos

um dia nós

ao nos despedirmos

escondemos

e agora

e agora

e agora enquanto cai as horas

nos apenas nos encontremos

por que não é bom viver sempre

não é bom...

não é bem viver sempre

apenas do que pode pintar

a nossa vasta mente...

Sabe, quase nada pode ser,

De tudo

Quase nada pode ser

Que se consumam as horas tardias

E que seja também para sempre

Como o é sempre

Em meu coração nordestino...

Sebastião Alves da Silva
Enviado por Sebastião Alves da Silva em 21/09/2008
Código do texto: T1188682
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