Naufrágio

Navios naufragados sonham à distância,

ramos de flores vêm dar à praia.

É o universo sem remorso: a ausência

de uma estrela a outra, e a renúncia.

Um corpo lançado à areia: abismo e exaustão.

Ouve a flauta: isto foi um jardim e garças,

as flores cresciam, quebravam os muros,

eram promessa, senão de permanência, de equilíbrio.

A luz da morte cresta as pétalas e as pedras.

Que busco na vida? A morte me oferece

a espiga dos dias, debulhados.

A morte é um peixe numa bandeja,

os olhos para os lados, alheia.

Abandono-me ao anzol, represo.

Os meus pés na areia e o esquecimento

nos ossos, flauta soprada pelo vento.