O SOPRO do VENTO

Pedro nasceu no mês de janeiro,

Sem dente, pelado e pobre, o único herdeiro.

Seu pai empurrava pedrinhas, pedras, pedregulhos,

E ao ouvir o choro, balançava o balaio do filho Pedro,

seu orgulho e trunfo primeiro.

Cresceu sem camisa, com os pés no chão,

Amassando lama, sofrendo derrotas,

comendo o amanhecido e das vicissitudes mundanas,

o duro pão.

Pai e filho:

Êta vida de marmotas!!

Saturado de tantas alegrias,

Ainda de menor, rumou para a cidade grande.

Sem pedir licença, passou por debaixo dos portais dos infernos,

para abrigar-se nos paraísos dos diabos.

Acontecimentos em estação fria,

Ocorridos sob a neve rigorosa do inverno.

No barraco havia coisas e baratas,

Enquanto que na mesa coberta com o pano roto,

Nada das cores da prata.

Nas tendas caiadas pelas metades,

Tomadas por idosos corcundas,

Havia comida e cantos fétidos a mijo e merda.

Nos terreiros das ruas, crianças infecundas,

Amontoadas, dias e noites inteiras.

E ali vislumbrou dois caminhos:

Ou seguia a escuridão dos iluminados,

Ou a claridade e o verso sem o reverso dos imergidos naquela solução.

Pedro, com tatuagens se decorou;

pendurou no corpo os metais e penduricalhos.

Dos calcanhares ecoavam o som do chocalho,

Enquanto surrupiava as cartas nos jogos de baralho.

Trocava as mãos pelos pés,

O dia pela noite,

A reza pelo: “aí...vamos...vamos...passe para cá rápido...perdeu...perdeu!”

Nesse fantasioso mundo, o moço evoluiu tanto que endoideceu.

Andando de esquinas em esquinas,

Bebendo a bebida dos bêbados;

Semeando a ordem,

Colhendo a desordem,

Essa era a pedra na botina de Pedro.

Sob a mira das armas que cospem lavas de fogo,

Sorriu sorrisos descorados,

Para homens desalmados.

Pedro que naquele lugar chegou por encomenda,

Em vez de se aprofundar nas oferendas,

resolveu tomar emenda.

Daquele momento em diante,

Na obra e no convívio do dia a dia,

Pedro deixou de ser bandoleiro,

E passou a ser o Pedro-pedra;

“Vai massa, brocha, água, telha, colher, caixote, pedra, Pedro?”

E Pedro levava uma vida de pá de cimento.

Sair da lama do concreto para pisar em mar de rosas subjetivo,

Esse seria o novo desafio,

do homem que virou pedreiro,

queimador de lâmpadas,

na tentativa de encontrar um fio de luz no último fiapo de algodão do pavio.

Sobrevivendo à fome e a miséria,

Construiu casas e casarões,

Massas, maçanetas em mansões.

E quando veio a inundação,

Com a ideia fixa e um pensamento só,

Rolou ribanceira abaixo coberto pela lama das enchentes:

“Por que fui deixar meus parentes,

as batidas do moinho e o angu de caroço,

desenhos remexidos pela pedra mó”?

Saturado de tantas alegrias mesquinhas,

Agora de maior, rumou de volta para o seu torrão.

Voltou para rever o pai e os parentes,

O moinho e o desenho do angu de caroço remexido pela pedra mó.

Pedro nunca mais rolaria ribanceiras abaixo,

movido pelas enchentes; em compensação,

Sem lar, sem roupa, sem dente, sem mar,

teria que tocar a vida, só.

Hoje, sentado com as pernas cruzadas,

Pedro, está no topo da montanha em cima de uma pedra,

Mirando o mundo ao seu redor.

Trocou a vida do transporte lotado,

Do embornal pesado à marmita fria,

Pela solidez, reflexão, plenitude, rezas e cânticos,

Ritos espiritualistas dos eremitas da terra de Tearsandoors

Mutável Gambiarreiro
Enviado por Mutável Gambiarreiro em 16/07/2015
Reeditado em 17/07/2015
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