RETRATO SEM BANDEIRAS
A cota não chegou para aquele menino sujo
Maltrapilho, cheirando cola na avenida Liberdade
Sentado na calçada pedindo esmola
Na porta da escola para comprar um lanche
Estudantes passam apressados atrás de notas
Trabalhadores tentam se equilibrar na corda bamba
Donas de casa pesquisam preços magros
No gordo supermarketing onde tudo vira produto
A cota não chegou para aquele menino
Que poderia ser eu, você, seu irmão, seu filho...
Não chegou nem vai chegar
Ele não é Sem-Terra, Sem-Teto, Sem-Universidade
É somente um sujo menino de rua
Maltrapilho, cheirando cola na avenida Liberdade
Sem partido, sem voto, sem movimento
Clamando ajuda para o seu sustento
Publicado originalmente em Cadernos Negros 29, poemas afro-brasileiros, Edição Quilombhoje, 2006.