O Mundo Contemporâneo

Esse mundo é insano,

Pelo menos a idéia mundana,

Vestidos com marcas, apenas pano,

Nem sabemos se somos gente humana.

Vamos a um fast-food comer,

Servem o alimento num saco,

Tudo descartável, inclusive você,

Aproveito o saquinho e vomito, sinto asco.

Temos a tv que nos dá o que pensar,

Talvez nos dê motivos para nem imaginar,

A internet serve para futilmente navegar,

Nem nos tocamos e achamos que isso é relacionar.

Os veículos nos levam de um lado a outro,

Vamos poluindo e ficando sedentários,

Pra crianças, desde cedo implatam o game (jogo),

Não se pode confiar nem no comprado noticiário.

Vamos vestindo nossas personagens,

Adotamos um rótulo como preconceito,

Queremos artificializar a paisagem,

Domesticar a natureza para nosso proveito.

Já fizemos guerra, hoje nosso ideais são mais mesquinhos,

Buscamos apenas o contra-cheque mensal rechonchudo,

Talvez um notóriamente weberiano consumismo,

Usamos a idéia de sistema para ficarmos imóveis, é nosso escudo.

Até as relações amorosas são inutilizadas,

O beijo vira modismo que chega ao status de herpético,

Os corpos são de uma sensualidade vulgarizada,

O sexo transformado em ato de condicionamento patético.

Em certos grupos pode-se observar a simetria,

Fazem lembrar uma produção de bonecos,

Todos como um rebanho feliz que desintegraria,

Artificiais a ponto de nem consigo serem honestos.

As comidas servem de sustento,

Cultura mecanicista que compara homem com máquina.

Talvez Deus Ex Machina tenha começado o tormento,

Agora somos vivos-mortos numa sensação de estática.

Os reality shows são populares,

Não porque imitam a vida real,

Mas a vida imita essa vil arte,

Vivemos a mentira, cotidiano irreal.

As estatísticas nos numerificam,

Eu não quero ser o número 512.883, gosto do 9,

A numerologia me ajuda, as coisas modificam,

Reduzo, 5 + 1 + 2 + 8 + 8 + 3 = 27 = 2 + 7 = 9.

As academias estão abarrotadas de gênios,

No entanto, nenhum deles consegue a fórmula que torne a gente feliz,

As disputas são acirradas em busca dos prêmios,

Mas no final, todos perdedores, a catástrofe da contemporaneidade infeliz.

A velha pecúnia, que teve sua gênese no escambo,

Mudou tanto de nome, chamam de dinheiro,

Alguns adotam como símbolo burguês, acabam de capital chamando,

Mas o que fazer quando a grana não resolve o desespero?

As propagandas vendem bem, inclusive nos compram,

O marketing deu um designer ao velho fetichismo,

Somos o que inventamos ser, muitos com isso sonham,

No final voltamos ao estado telúrico, embaixo da terra, consumidos.

Achamos até graça disso tudo,

Nossa estupidez permite autoridicularização,

Contemplamos a vida passar, levamos um susto,

De repente nos damos conta, o tempo não volta, que decepção.

As patologias seguem as regras de agora,

Depressão, morremos em vida de tristeza, olhos com brilho fosco,

Anorexia que promove esqueletos da moda,

Obesidade que faz o sujeito sentir seu peso materialmente doloroso.

Músicas fabricadas em escalas eletrônicas,

Arte recriada, logo, nem criada,

Sons, vídeos, velocidades supersônicas,

E a gente lento, na mesma passada.

Queria ser apenas expectador, ficar de fora,

Mas como personagem me sinto ausente,

Pareço um daqueles excluídos da História,

Um homo sapiens sapiens que procura ser gente.

E a chuva cai e não lava a alma,

Nem existe essa outra esfera corpórea,

A cortina desce e não se ouvem as palmas,

Vivemos uma fantasia de indumentária inglória.