BADALADAS

Ainda não se percebia

no caderno cinzento do céu

um rabisco de sol,

e já se ouvia

ao longe o toque do sino.

Eu, menino,

me perguntava

por que haveria tão cedo de tocar

antes mesmo do galo afiar a voz,

e enquanto seus ouvintes

ainda se emaranhavam

nos cobertores,

e nos estertores

de cada sonhar.

Pensava, inventivo,

ser obra dos anjos

ou dum canário,

silvando seu canto

no campanário.

A manhã

se espreguiçava lentamente,

homens saiam acelerados

dos bordéis

e o apito da igreja apressava

seus fiéis.

A vida se marcava

em badaladas:

a missa,

o batizado,

o casamento,

a procissão,

celebração

de corpo presente,

e de almas ausentes.

Mulheres e homens,

crianças também (que jeito!)

encaminhavam sua devoção,

e caminhavam em sua direção.

Ao chamado de Deus,

em qualquer que fosse

as instâncias

e circunstâncias

do badalar,

eles não haveriam de lhes negar

obediência

às amídalas metálicas

da garganta do seu sonoro

e diuturno mensageiro.

E a Igreja se completava

com fiéis que se enchiam de tanto rezar,

enquanto outros esvaziavam o seu pecar.

©️ Leonardo do Eirado Silva Gonçalves

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Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 22/10/2020
Código do texto: T7093553
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