DESIMPORTÂNCIAS
" Dou respeito às coisas desimportantes
E aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
Das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
Para gostar de passarinhos."
Manoel de Barros (1916-2014)
Fragmentos de "O Apanhador de Desperdícios"
DESIMPORTÂNCIAS
Sou apenas a insignificância
De toda essa maldita infâmia
Quando a vida se faz ateia.
Quando escrevo o que sou,
Deixo de ser o que descrevo
Quando tento ser o ator
E deixo a poesia na plateia
Queria despossuir-me de vaidades
Corromper-me come simplicidades
Evadir-me das falsas verdades
E das verdadeiras falsidades
Abster-me de complexas conclusões
Deixar a vida correr ao sabor do vento
E lançar todo e qualquer sentimento
No curso das indomáveis monções
Bastar-me-ia na intensidade do vazio
Ao dizer tudo e não dizer nada
Na mudez desta madrugada
Ao nadar contra a correnteza do rio
Queria apenas sorrir e poder chorar
Na pureza sublime da criança
E sem mais qualquer tardança
Voltar ao útero para me refecundar
Não suporto mais as relevâncias
Insígnias cravadas no peito vazio
Eu daria tudo para viver esquecido
Aquecido pelas desimportâncias
Expurgar da pele esse arrepio
De um corpo com sangue frio
Necessito me embriagar
Do meu verso vadio
Que vaga erradio,
Eirado que sou
Errado me vou
Desvairado
Avariado
Avaliado
Sem mais nenhum valor
Na beira do rio
Eu me afogo
Eu me afago
Quero ser o mergulhador.
Em meio a todas as instâncias
Não guardarei mais distâncias
De todas essas inconstâncias
Anseio pelas desimportâncias.
© Leonardo do Eirado Silva Gonçalves
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