Sobre o tempo e a porta
Há porta semifechada para
a volta acontecer, sem volta,
– a hesitação tremula – e, sem dúvida,
trêmula tenta de novo ênfase.
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Lá fora o sol de verão queima
a pele esguelhada submersa
na roupa de algodão fino e leve
com vocação para fio de veste.
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O silêncio em relação a ela
pela primeira vez tenta explicação
sem ressonâncias incabíveis,
os pés numa cadeira alta nada pisam.
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Essa pequena altura não desconfortável
é humilde como o sofrimento,
como a menos tenaz das dores,
dor prazerosa de espremer um cravo.
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Desde o mar, o ponto austral argentino
envia para o rosto algum frescor,
lá quase há mil e quinhentos metros
de profundidade há muitas milhas.
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Lá a ausência da lua deu vez
a Vênus de desenhar, à noite,
rastro de prata sobre azul marinho,
o azul das profundezas mais profundas.
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A crença de nunca fechar portas
quase acabou com o esquecimento,
o melhor lenitivo capaz de romper
o círculo vicioso de si sobre si mesmo.
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Desde a montanha se fizera a onipotência
capaz de transbordar como vulcão
e invadir as janelas transparentes da alma,
o sangue agora está homeotérmico.
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A porta é a de uma casa abandonada
em ruínas, com todos os materiais
de demolição esvaídos do espírito,
como se fosse mágica a desconstrução.
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A arquitetura atual em nada é gema
capaz de resgatar a chave jogada fora
dentro de um forno de fundição,
o momento só conjuga o presente e o futuro.
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A eternidade não é mais a soma
de três tempos, um foi subtraído
para melhor resultado dalgum cálculo,
há inúmeros quilômetros na estrada, afinal.