Autocrítica diante da esquerda e da direita
Não muito tempo atrás, a razão
se encheu de ira, como se fosse um pássaro
batendo asas nas paredes,
porque somente asas são capazes de serem
ouvidas por paredes. E as paredes em resposta
a cada batida das asas transformavam asas
após asas em bumerangues;
nenhuma parede quis abrir uma janela.
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A mãe, que dizia todos somos
iguais, erguera as paredes para poder ser
a única a escutar o canto do pássaro:
não sou igual a todos e me estranho
quando estou a sós ou a frente do espelho
que sempre insiste em mudar
a minha imagem.
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O pássaro esperava do pai ao menos
alpiste; e cantou o mais alto que pode
perto do teto (parede horizontal acima):
é preciso um limite; e repetiu o assovio,
como se reclamasse um braço forte,
sentindo-se capaz de suportar a força do braço
injusto dentro do grande equívoco
entre o não e o não, não: não! E não!
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Para ficar equidistante do não e o não,
não: não! O pássaro se fez de liberal
para tentar a onipotência entre o não e o não
até sentir a solidão libertadora capaz
de libertá-lo da ilusão do ódio transcendente
que faz a ira ser o cajado bumerangue
capaz de transforma o pensamento
em arma impotente, venal e tristíssima,
capaz de erguer paredes em volta das asas.
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Repulsa ao erro crasso o fez sentir-se
entre o sol sem fundo e o sol sem luz,
então voou ao sol sem fundo
para lutar com todas as forças contra o sol sem luz.