IMPERMANÊNCIA
IMPERMANÊNCIA
Ainda que
Conseguisse despertar
A inércia do vento
E pôr os grilhões
Nos seus eólicos braços
Se faria o movimento.
Mesmo que eu
Amordaçasse todos os sons
Suas notas e suas melodias
Haveria de se ouvir
Nas ondas do silêncio
Toda a sua sinfonia.
Até que o oceano congelasse
E as ondas brincassem
De estátuas permanentes
Sentiríamos o fluxo e o refluxo
Das marés e das nascentes
Ainda que o fogo
Se arrefecesse
E as labaredas
Se perdessem
Nas alamedas
Do outono
Seria possível
Sentir a sua chama
A nos roubar o sono
A nos tirar da cama
E mesmo que
Se sepultasse
Na noite fria
O cio da terra
O fio que descerra
Toda a sua evolução
Ouvir-se-ia
O compasso profundo
Que vem lá do fundo
Na batida do coração
O sopro da criação!
Nada adiantaria
Subverter o tempo
Cada segundo
Tirando do ponteiro
O seu ofício primeiro
De ser o carteiro
Que entrega a cronologia
Deste mundo.
O tempo
Não é invento
Do homem;
Apenas o seu marcador.
Ele nasce liberto
E corre, decerto,
Na veia aberta
Pelo seu Criador.
Somos, da vida, na liturgia
Uma gota da fonte
Que nos atravessa todo dia
Que nos faz ponte
Para nos mostrar
Que toda existência
É, por essência,
Impermanência.
© Leonardo do Eirado Silva Gonçalves
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23 de abril de 2019