O administrador de segredos

Criança-fada com asas de contos,

Engaveta as lembranças do porvir.

De lúdico pensamento e mundos para criar,

Revira armários, plantando a sua inocência.

Voa a tua mente, tropeça em cantos,

Segundos, horas e esbarra ao sorrir...

...Suspirando, se revolta: os pipas no ar

Levados pelo beija-flor da indecência.

Tua estante agora é mera ampulheta,

São as gavetas tão sujas de pó e areia,

Selando as certezas bobas que plantou,

Lombadas gastas de sua tenra mocidade.

Rascunhos velhos, sob bustos de estatuetas,

Enfeitam, inerte, suas intrigas e besteiras.

E a antepenúltima página que dobrou,

Faz guerra contra os seus anos de idade.

Maestro de arquivos, príncipe das prateleiras,

Administra os títulos dos dilemas vencidos.

Novo dia, esta rotina é a sua bola de neve,

De mentira em mentira: mestre dos esquemas.

Coroa sem coroa, administrador de bobeiras,

Em seu reinado de curativos fedidos.

Não mais achou o segredo que sempre serve,

O grande príncipe dos próprios problemas.

Fatídico isto, e em um átimo último e pulsante,

Lhe ocorre provar suas memórias de colher.

Puxa a gaveta, a mais desbotada e errante,

Surpresa! Não é uma memória qualquer.

Relembrou da cantiga, tão somente esquecida,

Nos falsos anos de vida, com um talher.