Poética - A dialética das três maldições
Poética - A dialética das três maldições
No ano de 1700
Uma vila foi acometida de uma terrivel maldição
Rogada por um antigo ancião ocultista
A maldição da cegueira fez com que
Todos os homens, mulheres e crianças da vila
Vivessem suas vidas na escuridão
Aqueles que não a suportavam
Se enforcaram na calada da noite
Aqueles poucos que sobreviveram a maldição da cegueira
Adaptaram-se a um novo estilo de vida
Com o passar dos anos, novas religiões e até mesmo
Novos costumes foram criados
Irritando então o antigo ancião
Que sobre a vila lançou mais uma maldição
A da surdez, os condenando agora
A viver no abismo do silêncio
Nas primeiras noites recém nascidos
Tiveram suas cabeças esmagadas
Pelos próprios pais
O ancião enquanto se masturbava
Com aquela cena de horror
Lançou a mais cruel das maldições
A maldição do amor
Devolvendo a visão e a audição
Para os moradores do vilarejo
Que agora eram obrigados a amar uns aos outros
incondicionalmente enquanto conviviam
com os horrores que haviam cometido
As mães que esmagaram as cabeças
Dos seus recém nascidos
Agora se alimentavam das suas entranhas
O amor incondicional os levou a loucura
Um homem amou tanto a sua esposa e seus filhos
Que os cozinhou vivos em óleo fervente
Para que eles vivessem eternamente
Em seu coração
E durante 93 noites o grande ancião
Os assistiu enlouquecer
Até que o suicídio e a miséria
Devastasse todo o vilarejo
Da carniça ao festim
Das tripas a podridão
Dos corvos se alimentando das carcaças podres
Até as baratas devorando os restos dos cadáveres
Sobreviveram somente os filósofos e os poetas
Entocados em grutas escuras
Enquanto cantarolavam olhando as paredes
O ancião então adentrou aquelas grutas
Espantado, ele os indagou
- Como conseguiram sobreviver as minhas maldições?
Os filósofos gargalhavam como sátiros
Enquanto os Poetas dançavam sinfonias silenciosas
- Quando tirou a nossa visão
Nos apaixonamos pela escuridão
- Quando tirou nossas vozes
Fizemos orgias com o silêncio
- E quando nos deu amor
Abraçamos nossas angústias
Fizemos das suas maldições
Bênçãos para um novo amanhã
- Gerson De Rodrigues