O Eterno Natimorto
O meu futuro não existe
Ainda vai existir
E morrer quando nascer
Porque o que persiste
Não é o que vou viver
Mas aquilo que já não existe
O que não posso esquecer
O meu futuro
É um olhar para trás
É ver-se de repente
Com umas rugas a mais
Um pouco mais de cansaço
De solidão
Companheiros que se foram
Amores que nunca chegarão
Porque o complicado
De viver
É estar sempre esperando
Por algumas coisas que pensamos
Que nunca chega
Mas que por nós está o continuamente passando
Já passou aquele que vi ontem no espelho
Preocupado com a flacidez
Uns cabelos prateados por ali
E a moça que não é mais moça
Reclama-se
Dizendo que era tão bonita
E deixa transparecer
Que sente pudor
Ao despi o seu corpo
Na hora mágica de fazer amor...
Já passou muitas pessoas em mim
E tudo foi tão rápido
Que nem cheguei as conhecer
Houve um que sonhava de mais
Outra que em nada queria crer
E outro que amou todas as coisas
Com esse passei mais a conviver
E hoje às vezes ele vem
E me diz apontando
Da beleza das coisas
De uma formiga numa pétala branca andando
Do homem absorto que parece
Procurar um jeito de morrer...
Diz ele que a beleza estar em tudo
Em qualquer lugar
No ser mais bruto
Nos mais singelo carinho de que sabe amar...
O meu futuro não existe
Não existe o futuro de ninguém
Mas há o sonho
Para dizer a todos e a mim também
Que no dia de amanhã vai dar tudo certo
Sabemos que o amanhã ainda vai haver
E quando sol nascer matando a escuridão
Talvez esteja eu,
Estejamos nós mortos também...
Todavia se isso não acontecer
E mais uma vez sentirmos nos olhos
E nos poros
A energia astral
Não que o futuro tenha chegado,
Não,
O futuro,
Queda-se sempre num eterno funeral...
O meu futuro não existe
Ainda vai existir
E morrer quando nascer
O que persiste
Não é o que vou ser
Nem o que fui
Mas o que sou agora
Agora nesta hora já passada
O que as palavras
São incapazes de dizer
É assim
Por que o meu futuro não existe
E morre mesmo
No próprio ato de nascer...