NA PLÚMBLEA MANHÃ SEM SOL
Na plúmbea manhã sem sol –
nem vestígios de o vir a ter –,
o mar é calmo, falso arrebol,
por trás dos montes a haver.
Inda assim, estranhos casais,
passeiam-se demoradamente,
junto às casas, com seus taipais,
que os humaniza, vagamente.
A tudo vejo, no pensamento,
que aflora, por minha vontade –
faço-me ser duplo no firmamento,
e sem o saber, não tenho idade.
A versar e a sonhar, quem sabe
um momento, de felicidade,
não se traz, no que na alma cabe?
Ou serei só um espelho, em falsidade?
Breve, leve, corre uma brisa suave…
nunca quis grandes cousas aqui,
de mim, para mim próprio, sou entrave,
e com olhos, de tacto, a tudo vi.
Olhar é estar doente dos olhos…
que a ninguém ou cousa alguma vê –
ter nas mãos, flores, aos molhos,
pergunto eu então: para quê?
Na arrogância, a tudo pertencermos,
somos nada e promiscuidade…
nascem as cousas, jazem e morremos,
tudo o mais é dos deuses, diversidade.
Ah, sonhar, enfim, e, em sonho, dormir;
agora que sinto o mar revoltado…
quem sabe, o que está ainda por vir,
não mo importa, não serei acordado.
Estou cansado das gentes banais,
que vivem, porque vivem, sem o ser –
vejam bem, que são elas, as que tais,
que andam no mundo, sem o saber.
Jorge Humberto
10/01/11