Mors Aeternitatis
Nas sombras do crepúsculo, onde o tempo se dilui,
Jaz o homem, esquálido, vencido pela própria carne,
Um ser que outrora fora vigoroso, agora mero espectro,
Deitado no leito ermo, no abraço final da matéria pútrida.
Seus olhos, baços, mal enxergam o horizonte macabro,
Onde a vida, num sussurro trêmulo, se despede sem cor.
Ah, a dor que consome sua essência é mais que física!
Ela é a alma dissolvida, a memória que apodrece,
O grito silenciado no eco vazio do universo.
O suor frio que desce por sua fronte enrugada,
É como orvalho nos campos da morte,
Regando o solo estéril, onde flores jamais nascerão.
A Morte, em sua forma sublime e terrível,
Se insinua como vento gelado, soprando a chama que vacila.
Seus passos são inaudíveis, mas seu toque é certo,
Como o destino gravado nas estrelas de um céu indiferente.
Ela é a lotérica de ossos, a rainha das sortes macabras,
Que carrega nas mãos frias o relógio da finitude,
E ergue a ampulheta, onde cada grão de areia
É uma fração do universo que se desfaz.
Ela não sorri, pois não há prazer em sua tarefa.
Mas também não lamenta; sua indiferença é a marca
De um cosmos regido pelo caos sem paixão.
“Teu tempo, cavaleiro, está marcado,”
Diz ela, numa voz que soa como a terra sendo cavada.
“O sol, que um dia iluminou teus feitos, agora se apaga,
E as glórias que te adornaram são penas que o vento dispersa.”
E o homem, envolto em agonia, levanta os olhos em súplica,
Busca nos céus uma réstia de esperança,
Mas o firmamento o olha de volta com vazio sepulcral.
As estrelas, essas cúmplices distantes, cintilam indiferentes,
Como testemunhas frias de sua queda inescapável.
Ele vê, então, o vazio que se abre diante de si,
O abismo imenso onde o tempo não existe,
Onde nem memória nem arrependimento podem residir.
E, nesse instante, enquanto a morte o envolve,
O homem se recorda dos dias passados —
Dos campos de batalha ensanguentados, onde ergueu a espada,
Dos amores intensos, agora cadáveres na memória,
Das palavras que jurou, agora ecos que se perdem no esquecimento.
Tudo o que ele foi, tudo o que acreditou ser,
Desfaz-se como um sonho esquecido ao despertar.
As promessas, que outrora pareciam eternas,
São agora sombras desvanecidas nas paredes de sua mente.
As cicatrizes, testemunhos de seu passado glorioso,
São apenas marcas numa carne que se desintegra,
Uma pele que, como todas as coisas, retornará ao pó.
A dor maior, porém, não está em sua carne apodrecida,
Mas no vazio que se instala em seu espírito,
Onde outrora houvera orgulho, coragem e desejo.
Agora, diante da implacável senhora da morte,
Ele percebe o quão efêmera é a existência humana.
Não há julgamento, não há clemência.
Há apenas o ciclo natural que se encerra,
Como o outono que despenca suas folhas no chão seco,
Ou o rio que encontra o mar e se dissolve em seu seio.
A morte, serena e terrível, estende a mão ossuda,
E o homem, com o último fio de força que lhe resta,
Entrega-se ao toque gélido e eterno.
Não há luta, pois não há mais força para resistir.
Há apenas a aceitação final, a resignação de quem sabe
Que o fim não é um evento abrupto,
Mas uma lenta erosão de tudo o que se foi.
E assim, com um último suspiro,
Ele liberta sua alma, que já estava presa demais à carne.
Seu corpo tomba no leito, uma massa inerte e fria,
Enquanto sua essência, que antes ardia como fogo,
Se apaga como uma vela que já não tem cera.
A morte, com sua ampulheta agora vazia,
Se ergue e segue seu caminho,
Em busca de outras vidas para ceifar,
Outras histórias para terminar.
E o homem? Ele já não é mais.
Seu legado, se é que algum dia houve um,
Seria apenas um eco no vento,
Que, por fim, se extinguirá como tudo o mais.
As estrelas, imperturbáveis, continuarão a brilhar,
Indiferentes à pequena tragédia humana que presenciaram.