Um Corpo Sem Órgãos
Criatura deslizante
Que não se fecha
Nem quando se por
Dobra.
A visão de olhos
Vedados pela
Pele que se
Esparrama.
Cada cavidade
Nasal diminuta,
Dificulta a
Passagem de ar.
Se recusa a diluir,
Fecha o ânus com
O lacre dos esfíncteres.
Ulcerando o
Estômago inquieto,
Por concentrar o que
Apodrece.
O suco gástrico
Corrói a laringe,
Impedindo de sair
Por não existir
Cavidade bucal.
Estas cerdas não
Se fazem língua,
Dentro da boca
Desdentada.
Rumina no
Movimento incessante,
Já que não possui nada
Que possa sustentar o
Vazio gritante em busca
De alguma acomodação.
Delírio de um isso liso,
Golfando pra dentro
Sem que interior haja.
Um quase constante,
Violento e perturbador.
"Há o outro tema, aquele de um corpo sem órgãos, que seja privado de órgãos, olhos tapados, narinas apertadas, ânus fechado, estômago ulcerado, laringe comida, 'nada de boca, nada de língua, nada de dentes, nada de laringe, nada de esôfago, nada de estômago, nada de barriga, nada de ânus': nada além de um corpo pleno como uma molécula gigante ou um ovo indiferenciado."
[Gilles Deleuze, com passagem grifada de Antonin Artaud, "Dois Regimes de Loucos: textos e entrevistas (1975-1995)", 2016, página 24]