Escatologia

Nadando em fezes,

Expulsas de bundas,

Que por reveses,

São tidas como imundas.

Revirando intestinos,

A ponto de gemer,

De joelhos se vê caindo,

Com as mãos a tremer.

Chorando sangue coagulado,

Que gruda nas pálpebras,

Deixando os olhos colados,

Preso na sensação de náusea.

O mundo comprime e oprime,

Engolido por canibais famintos,

Expelido em vômito que agride,

Inundando a boca de famintos.

Os dentes afiados mordem,

Rasgando carnes putrefatas,

E os que tem pé ainda correm,

Sangrando as solas descarnadas.

A fé escapa entre falanges abertas,

E na musculatura espasmódica,

Sente-se a gangrena que acelera,

Diluindo tecidos de forma aleatória.

Na fala de gemidos sofridos,

Sufocados pelo refluxo,

Que acidula a garganta do aflito,

No sufocante fim do mundo.

Arrastando-se por entre lesmas,

Que são chorumes cadavéricos,

No deslizar de poças indefesas,

Formando lagos de corpos velhos.

Vemos a fumaça do fogo fátuo,

Azulando catacumbas decompostas,

Dando um fim à fossa dos nossos atos,

Aplaca a fome de vermes que vão à forra.

Bebendo de pulsos rasgados,

Como vampiros decrépitos,

Com lâmina de metal enferrujado,

Mutilando a esperança dos inválidos.

No despertar das fúrias,

A sedução da tragédia,

Que avermelha a lua,

Rindo da nossa miséria.

Com árvores repletas de morcegos,

Que despencam feito frutos podres,

Encharcando o solo de um medo,

Compondo um tapete de dissabores.

Sob a supervisão de gatos negros,

Que são apenas sombras de felinos,

Daqueles maltratados em segredo,

Estripados por um doentio sadismo.

Enquanto as corujas atentas,

Viram a cabeça para nada escapar,

Acolhidas pela floresta densa,

Que não deixa o raio solar penetrar.

Pelo esgoto a realidade escoa,

Tragados pelo ralo do diabo,

Que tritura os restos da pessoa,

Expurgado o paraíso dos coitados.

Anjos com asas podadas,

Despencam dos céus em chamas,

O impacto das quedas estala,

Trovões que o apocalipse proclama.

Bolas de fogo exterminam aves,

Escarradas por um universo indigesto,

Fazendo com que igrejas arrebentassem,

O Céu resolve mudar e se tornar Inferno.

O pânico das encruzilhadas,

Com cabeças de porcos decapitados,

Bruxas ainda são guilhotinadas,

Homens imploram por um fim rápido.

As serpentes beijam as bocas magras,

Envenenando a vítima paralisada,

Engolida por criar sua própria desgraça,

Acolhida pelo ventre que a consagra.

Afundamos no lodo da consciência,

Com viscosidade que faz afogar,

Não existindo nenhuma divina clemência,

Que possa resgatar o moribundo a chorar.

Cada criança vomitada na vida,

Por vaginas reprodutoras de desolados,

Cresce contaminada pela sina,

Dos trazidos ao local dos desafortunados.

Cabeças decepadas parecem ver,

Seus próprios corpos decapitados,

Como se pudessem de novo obter,

A junção daquilo que foi separado.

As forcas ainda pedem as cabeças,

Mas continuam com seus nós apertados,

Suspensos, esperando quem os conceda,

Oportunidades para enlaçar os enforcados.

Quase é possível avistar um sorriso,

Esculpido no rosto de um defunto,

Largado em um pântano de esquecidos,

Gargalhando escondido, de tudo.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 08/03/2014
Código do texto: T4720961
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