Ventos Nunca Antes Sentidos...

As lavas corpulentas e avermelhadas

borbulham sob os meus velhos pés

Sinto ardências quase insuportáveis!

Incômodos viscerais, perturbadores,

inestimáveis. O sangue sai de repente.

Escorre em curso natural. O vermelho

nato, deu lugar a quase transparência

O líquido se dispersa pela terra inóspita,

por orifícios medonhos, orifícios inexploráveis.

As chamas do eterno fogo, queimam a

quase tudo! Queimam a quase todos!

As cenas de pesadelo me apavoram!

Os gritos das profundezas, agora

jorram! Lamentos angustiados, percorrem

todo o vazio obscuro e sufocante... Almas

imersas à aflição, suplicam enlouquecidas.

Sem retorno, choram.

Quanto horror em meus olhos absortos!

Em tão pouco tempo de estadia!

A estrutura do tempo está congelada.

O tempo está inerte à nave do nada!

Apenas me deixo levar sem qualquer

reação, por ventos nunca antes sentidos...

Sinto falta do calor sincero dos familiares.

Sinto falta daquela pacata, e reconfortante estrada.

Avisto um pouco abaixo dos pequenos ramos,

um mar fervoroso em tom rubro. Nele,

há pessoas amarguradas por excelência.

Nele, há vozes conjuntas pedindo clemência.

A apreensão se instala em meu rosto. E vou

sendo levado por ventos nunca antes sentidos...

Nesse instante, os pingos desoladores de enxofre,

caem sorrateiros pela mórbida dependência.

Imerso a náuseas intensas, vou sendo levado por

ventos nunca antes sentidos... Achei por toda uma

vida, que o desprezo em meus domínios, exercia

seus melancólicos fascínios! Mas, nesse turbulento

e miserável mundo, sou apresentado com todas as

honras, às facetas desprezíveis. Somente vivendo

por aqui, é que podemos sentir com demasiada

força, o real sofrimento em seus declínios.

Continuo preso a estranhas forças relevantes.

Sigo escoltado por ventos nunca antes sentidos...

Deus opressor e inadmissível! Por que não

implementa no inferno, sua escrita ilegível?

Nenhum acontecimento extraordinário cruzou

o meu caminho. Nada bateu de frente comigo.

Fui pensante por todos os minutos. Fui até feliz.

Mas, sempre por um caminho indistinguível!

O suor desce fervendo do corpo esgotado. Pressinto

o fim, mas não quero admitir. A minha matéria se

foi há pouco tempo. Vive inerte em um pequeno

pedaço de terra, ao relento. Mas, não dorme a

eternidade sozinha. Alguns poucos vermes

permanecem velando-me. As lápides monumentais

permanecem distantes. Apenas uma triste cruz

testemunhou o sepultamento.

Mas, não me importo nenhum pouco. Todos conhecerão

a faceta horrenda da morte! Mesmo estando em um

labirinto complexo e infinito, ela abafará o seu

agonizante grito. É o nadar em mares calmos e

perfeitos o que importa. A alma necessita dessa calmaria. Quando em vida os olhos se fecharem, terá que

encontrar olhos serenos num rosto irrestrito.

A sorte não habitou os meus aposentos. Por isso, sou

levado por ventos nunca antes sentidos... Sempre tive

uma dúvida mortal. Ficava imaginando se o espírito

sentia dores, se chorava, coisa e tal... Como é cruel

obter essa certeza doída! Estou chorando copiosamente!

Estou com medo... Sinto dores em toda a minha enérgica

estrutura. Acabo de entrar num devastador vendaval.

Avisto diversas expressões tristes e desoladas. Elas

dariam dó no mais desalmado carrasco. Vagam inquietas

pelos ventos, estão desesperadas! Imploram pingos de

água, as pobres enfistuladas. Estendo as minhas mãos

em direção às miseráveis. É difícil tal interação.

Completamente impossível. Vou deixando as sofridas

almas para trás. Vou seguindo sem destino,

pelos ares das nevoeiradas.

O vendaval abrandou nesse minuto. E com tudo mais

nítido, pude observar melhor aos arredores. Quantas

almas postas em fila indiana! Quantos jugos fora de

questão por uma mente podre e insana! Há realmente

um enorme tribunal! Como descrito em letras pequenas

nas escritas religiosas. Sou deixado nessa arrepiante

e sórdida fila. Tremo feito um filhote de gazela

na imensa savana.

Vejo transtornado uma figura enorme! Com suas barbas

negras, e um semblante asqueroso. Está bebendo uma

taça de vinho, imerso às vaidades. Vai julgando as tristes

almas, segundo às suas verdades... Em risos histéricos,

observa atento todo o aglomerado. E lançam todas para

um abismo implacável! Não vejo o paraíso como no livro

retratado! Somente transtornos irreversíveis, vorazes calamidades!

Chega a minha vez no julgamento. E os olhos furiosos se

lançam ao meu encontro! Deus me dirige a palavra:

_(Por que a minha escrita questionastes?)

_(Por que não se humilhastes?)

_Nado contente num mar de pensamentos livres!

_É reprimível a escravidão da liberdade!

_(O seu castigo será o vagar pelos abismos!) _Não me importo! Em meu coração jamais entrastes!

Fui lançado sem misericórdia. Mas que ironia não?

Foi por um ser intitulado misericordioso...

Há dias, estou perambulando por abismos solitários.

Mas, ainda não faço parte desse sistema doutrinário!

Apenas sinto uma devastadora sede. Somente sede.

A isenção da água foi o objeto retalhador. Mas, até

sorrio pelos cantos da boca. A minha mente não foi

lavada! Ainda sigo forte nesse calvário.