À Bordo Da Pequena Barca
Sinto a brisa gélida de Janeiro balançar as cortinas do meu quarto, e se lançar afoita sobre o corpo pálido deitado em uma rígida cama.
A porta que permanece sempre trancafiada, por não receber a visita dos amigos e entes mais próximos há alguns devastadores anos.
Sinto o aroma enjoativo das centenas de flores mortas que circundam o meu modesto e desarrumado casebre de madeira.
O anoitecer repentino que me transporta para as escuridões mais depressivas em imutáveis e horripilantes transtornos.
Sinto o odor quase insuportável do sangue escuro e bastante denso, que deleita contente pelo assoalho do meu esquecido quarto
A ausência das palavras reconfortantes que poderiam ser expelidas por seres íntimos e altamente confiáveis
Sinto o vazio enlouquecedor que devora os meus orgãos lentamente, com a fúria arrebatadora de milhões de ciclones
O fim da longa estrada a metros do meu corpo cansado, o abismo que se sucede à espera dos meus passos instáveis.
Sinto o alvoroço das aves de rapina e as sanguinárias hienas, sedentas pela carne que será lançada aos seus pés enrugados
A tarde silenciosa me perfurando sem misericórdia, com seus gritos inconcientes martelando em meu mundo de loucuras
Sinto uma dor apavorante que destroça o meu coração, transformando-o em migalhas simples e irreconhecíveis
O olhar perdido no reflexo embaçado do diminuto espelho, que reflete a todos os cantos o homem à deriva em suas fracas estruturas.
Sinto a respiração ofegante e quase finda, no transcorrer quase programado dos meus últimos e melancólicos segundos
Uma figura imponente percorrendo toda a minha sala, em passos cadenciados e tortos
Sinto a voz suavemente entrando em meus velhos ouvidos, com frases acolhedoras e promessas de um mundo melhor
A face reluzente de um senhor com barbas grossas e brancas. O sorriso cínico e inigualável do temível deus dos mortos!
http://alexmenegueli.blogspot.com.br/ 02/02/2013