Cardeno

Com sua forma quadricular,

Fechado, cozido com arames,

Abre para a escrita adentrar,

Possui diversos nomes.

Folheado, dizendo-se branco,

Mas repleto de linhas,

Com margens esbeltas nos cantos,

Pronto para receber grafia.

Arrancam suas folhas,

Furioso ato de despedaçar,

Desprendendo sem escolha,

Laudas que se poderia usar.

No início um prefácio,

A ser composto pelo dono,

Alcunha que serve de cabeçalho,

Imagem que fabrica sonhos.

As letras percorrem os caminhos,

Dando ares de algo artesanal,

Na revolta se faz um extenso rabisco,

Copiamos nele de forma maquinal.

Abre e fecha, insinuando passagens,

Pulam sua ordem por mofa,

Capa dura ou mole, há quem agrade,

Material indispensável na escola.

Separa receitas para degustação,

Anota segredos, feito fiel diário,

Acumula conteúdo para especulação,

Queimados em rituais de magos.

Caderno é esse livro a ser escrito,

Vindo em branco para o autor anônimo,

Passivo da criatividade do indivíduo,

Compartilhando dádivas e espantos.

Nos ajuda a acertar a caligrafia,

Acusa por demonstrar o não feito,

Expõe sem adulterar, eis sua maestria,

Usado até mofar e amarelar por inteiro.

Quando somos presenteados com ele,

É um incentivo a agir sobre o objeto,

Que se deixa usar diversas vezes,

Instigando quem ganha, isso é certo.

Cada um de nós se faz assim,

Aptos a mostrar o escrito,

Aderindo a mão que nos dá outros fins,

Escritores e escritos, eis o nosso rito.

Quantas páginas, desejamos arrancar,

Rompendo aquele elo de um passado angustiante,

Mesmo no presente, queremos só uma vez amassar,

Atear fogo naquela nefasta lauda, por um instante.

Escrevem sobre nós, a ponto de não sabermos quem somos,

Passivas páginas que o lápis cruel risca sem piedade,

Marcados com tinta que não se apaga nem sob o pranto,

E escrevemos nos outros, repetindo essa maldade.

Alguns arrancam e desperdiçam muito papel,

Fazendo com que deixe de existir mais rápido,

Outros, vagarosamente rompem o véu,

Mas todos fazem o caminho de humanos catálogos.

A vida imprime em nossas folhas brancas,

Onde a carne sulca pela pressão da escrita,

E quando velhos, somos páginas gastas de esperança,

Aguardando o fim do caderno, que sempre termina.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 09/10/2012
Código do texto: T3924426
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