Dias de Pouca Esperança
A cidade fala de forma cinza,
Com suas chaminés eloqüentes,
O cidadão comum não se anima,
Passeia por avenidas deprimentes.
O ir e vir automobilístico,
Agregam sinfonia descompassada,
É um transitar quase turístico,
Sabendo para onde vai a próxima passada.
O sorriso sem expressividade do pedinte,
A mão estendida num gesto maquinal,
A esmola do desdém que sacia seu apetite,
Um humano largado, feito de marginal.
O mercado dita e agita a vida,
Os filhos crescem e saem em busca de sustento,
A metrópole é povoada de pais sem filhos, falta companhia,
Enquanto as rodovias pululam de rebentos no relento do movimento.
O choro passa a ser copioso e sem graça,
Emoção engarrafada que se vende aos montes,
Nunca se sabe qual a gênese dessa desgraça,
Apenas sofre a metamorfose que é overdose de instantes.
Crianças já são vistas como futuros sem esperança,
Os idosos resistem com ar taciturno,
A linguagem parece corroída pela sofrida andança,
Os mudos exprimem um grunhido de luto.
Os frutos das poucas árvores,
Em meio à paisagem em preto e branco,
Apodrecem sem quem os resgate,
Rejeitados pelas larvas em pranto.
Os galhos que pendem,
Parecem um triste aceno,
Não há quem os oriente,
Apontam sempre um centro.
As cabeças abaixadas,
Mesmo quando de face levantada,
Procuram uma fé em migalhas,
Encontrando apenas o beiral da calçada.
Os olhos apagados por falta de brilho,
Seguem sua condição de túnel ocular,
Olhares quando se encontram são abismos,
Por isso fitar o chão é a melhor forma de ocultar.
Dois rapazes se beijam, poderiam ser duas moças,
Mais o ósculo breve, parece um franzir de sobrancelhas,
Um trivial cumprimento que ignoramos a outra pessoa,
Mesmo tocando-lhe a face de forma tão lisonjeira.
A luz solar emerge tímida do vão dos prédios,
Enquanto o mormaço aflige a sociedade asfáltica,
Ternos causam a impressão de um padrão sério,
Outros animais vivem de restos dessa odiosa fauna.
Sacis de muletas usam chapéus menos exóticos,
Enquanto homens que não se levantam,
Seguem trajetos difíceis para resolução de simples negócios,
Mortos mantidos vivos dos respiradores não se cansam.
De repente, um pequeno desastre,
Aquela risada destoando o ambiente.
Será que existe essa falsa felicidade?
Alguém ainda observa, mesmo com olhar deprimente.