A Vida Passando
Sentado, vejo a vida passar,
A janela transmite,
Imagens soltas no ar,
Eu sou expectador que assiste.
Colo os olhos no vidro,
Tentando engolir a paisagem,
Mas apenas esboço um sorriso,
Tudo dissolve num ato sem idade.
O que fui ontem,
Aparece em memória rota,
Por mais que me contem,
Sinto que o meu presente descola.
Esqueço do que fui,
Porque nem sei o que sou,
Sigo por um oculto que conduz,
Um caminho sem rota me restou.
O que serei é uma nova sombra,
Que abre asas de abutre,
Saciando-se com oportunidade que soma,
Desejando o putrefato que ainda nem nutre.
As gaivotas rodopiando,
Sigo o movimento cíclico,
Aprisionado em um canto,
Um peixe-mamífero nesse aquário vítreo.
Consigo escapar feito resta,
Os faróis de outros carros,
Deixam um borrão como fresta,
Adentro feito larva em busca de espaços.
Pessoas significaram e tendem a significar,
Não sei quando fui a atenção de alguns,
Agora um retrato perdido a empoeirar,
Um nome citado em raros momentos diminutos.
Aquele cão indeciso no acostamento,
Me identifico com seu andar nômade,
Talvez logo atropelado no cruzamento,
Ainda assim com olhar de contentamento constante.
O livro ao lado se tornou apêndice intocado,
Leio a vida passando por essa tela,
Não admito que tenha autor esse belo quadro,
Me dou conta que faço parte dessa aquarela.