Eva

Olho para estes olhos de Eva,

Pois saíste de mim,

Nascida das entranhas desta fera,

Liberta para um triste fim.

Natureza rebelde,

Por renegar essa submissão,

Jamais totalmente entregue,

Pronta a trair qualquer dominante Adão.

Vênus de carne separada,

Feita partir de outra criatura,

Espécie de reflexão animada,

Movendo-se é uma leve figura.

Traços finos em contraste,

Aquela robustez máscula,

Seduzindo em erótica arte,

Faz do observador uma estátua.

Cabelos em harmonia com pentelhos,

Cabeleira vasta de mulher mata,

Mãe das mães de um mundo sem herdeiros,

Origem da história humana que é trágica.

Para a vida sem Paraíso,

De costas ao Jardim Prometido,

A face abre-se e contempla o abismo,

Caminhantes sem destino.

Sangra por hemorragia causada,

Pelo fruto proibido consumido,

Transbordando a maldição consumada,

Despejando no solo o soro do não nascido.

Mulher que é separação de gênero,

Opondo-se ao antes supremo,

Erigindo a dúvida como pilar do seu templo,

Atena de olhar doce e sereno.

Nua desnuda a libido,

Liberando o desejo oprimido,

Erotizando seu marido,

Fazendo do corpo algo divertido.

De sua formação contraditória,

Nascerá rebentos inglórios,

Filhos homicidas por discórdia,

Lançados em sacrifício póstumo.

Pare as dores dos que ainda virão,

Em um gemido que faz o Mjolnir se calar,

Expelindo inclusive esse adâmico embrião,

Do seu ventre que a carne irá germinar.

Abrindo as pernas revelou os portões,

Do Jardim Secreto onde guardavas o Fruto,

Agora convertido em cálice de celebrações,

Templo vivo que faz nascer o futuro.

Fazendo de sua leveza anímica um espírito,

Eva que virou Ave que antecede a dádiva,

Evanescente figura, Eva Nascente é o rebento vivido,

Evaporando até condensar e voltar como geração atávica.