Vida

Quero viver,

Mesmo que não saiba.

Como proceder?

Isso não basta.

Ando passo a passo,

Pulo pelos caminhos,

O lugar eu desfaço,

Um fluxo de rio.

Sinto algo,

Definir o sentir,

Me sinto descalço,

Melhor para o solo sentir.

Odores são impregnações,

Sou flor que exala também,

Ambientado a emanações,

Sou todos sem ser ninguém.

A explicação é frustrada,

Raciocínios enlouquecem,

Mesmo com morte anunciada,

Intensos instantes não se esquecem.

Esperanças enfadonhas,

Vivo esse instante imperceptível,

O resto é sonho que aprisiona,

Sou tomado por infindáveis apetites.

Danço em ritmo epiléptico,

Tateando a atmosfera,

Me faço um visionário cético,

Domador de mansas feras.

O retorno ao selvagem,

Animalizando esse civilismo,

Me despindo de roupagens,

Chegando ao nu do niilismo.

Bruto demais para ser líquido,

Maleável demais para ser rocha,

Não sou isso muito menos aquilo,

Definido como perfeito idiota.

Mando beijos aos insetos,

Na tentativa de sugar-lhes,

Aquele pólen que é resto,

Povoando vários lugares.

Minhas asas são cortadas,

Mas consigo voar como Ícaro,

Caindo com afronte despedaçada,

Antes isso do que pensar outro motivo.

Pensar é deixar de viver,

Por isso quero o orgasmo,

Me priva de ideias conceber,

Gozando, o cérebro eu castro.

Me disseram para renegar,

Tudo aquilo que habita em mim,

Não posso me repudiar,

Preciso é dar essa falatório, um fim.

A ciência é nosso novo esoterismo,

Mas e o exótico sensível,

Quando molho e com o vento arrepio,

O beijo de amor indescritível.

Balançando na rede das emoções,

Em um ir e vir nauseante,

São pequenas e gloriosas agitações,

Dissolvendo em êxtase delirante.

Absorvo em um trago esse mundo,

Engasgando com sua solidez,

Digerindo até o término de meus dias absurdos,

Uma existência de embriaguez.

Vejo reis que reinam sobre lixo,

Presidentes presidindo o caos,

Sociedades de falsos moralismos,

Tragédia como indiferença habitual.

O cheiro de mato é raro,

Só temos o aroma asfaltado,

O petróleo que cobre o pasto,

Nosso habitat fabricado.

Quero rastros de pegadas,

Mas só tenho trilhas automobilísticas,

No máximo, passadas cimentadas,

Não sou considero, apenas como estatística.

Numerologia de quantidades,

Diluindo o tudo em nada,

Habitantes de cinzentas cidades,

Suicida de morte prolongada.

Me fazem progredir,

Não desejo passar idades,

Ontem era criança a evoluir,

Hoje adulto que aguarda a senilidade.

Etapas que cortam a vida,

Vivo em jogo de fases,

Jogo as para o alto essas fichas,

Prefiro blefar com severidade.

Olho para os olhos do cadáver,

Inexiste esse brilho que há no meu,

Deixou de transmitir minha imagem,

Extinta a conexão que um dia nos comoveu.

Herança de uma história finita,

Findando a cada instante,

Soma de fins que não são um todo acabado ainda,

Cada geração com seu ato culminante.

Sempre alguém levanta o tapete,

Enxerga os fósseis enterrados,

A sujeira aparece diversas vezes,

Não adianta pensar que está tudo arrumado.

Esse horror de família,

Instituição privada,

Precisamos sair dessas ilhas,

Vamos além da amurada.

Se o canto da vida é de sereia,

Sejamos tragados com alegria,

Antes isso do que maquínicas nereidas,

Que o sopro funéreo não nos aflija.

O que pensa uma vespa?

Talvez nada, o que importa?

Vive mesmo que não compreenda,

Amando tudo porque tudo ignora.

Quem já disse eu te amo a um mendigo?

Somos acostumados a estética mais próxima,

A higienização que coloca acima do outro como limpo,

Mas que é suja de uma imundície ética inglória.

Vida estranha que me faz apaixonar,

Copulando com suas intensidades que me atravessam,

Sou cortado, lacerado, até mesmo ao respirar,

Movido por forças que autoritariamente infestam.

Quanto menos sei, mais vivo,

Saber é socraticamente sem sentido,

Nem com o nada saber regozijo,

Vivendo em um mundo sem Cogito.