O Fundo é Raso

Diz-me se o fundo,

Tão imponente,

Com idéia de submundo,

Não passa de prepotente?

Mergulha num rio,

Se quiseres em oceano,

Toca o solo bravio,

Veja como é simples plano.

Virão falar sobre mares abissais,

Um dia teremos equipamento,

Para penetrar nesses recônditos lugares,

Não existirá mais esse comedimento.

Penhascos, desfiladeiros,

De cima são uma fundura,

Desce até o solo desses relevos,

Verá que rasas essas figuras.

“O buraco é fundo, acabou-se o mundo”,

Assim dizia a cantiga popular,

Mas a fissura sendo rasinha, pode-se tudo,

A mundaneidade sobrevive sem apocalipsar.

O corpo parece abissal,

Vira do avesso as entranhas,

Mostra que isso é banal,

Misticismo que logo desencanta.

Teologizaram o espaço,

Epíteto de despótico universo,

Anverso, se vira de cabeça pra baixo,

Buraco negro escoa em inverso.

Nietzsche bem escreveu,

Se olha pro abismo, esse olha pra ti,

O fundo é o Outro em relação ao Eu,

Mostrando quão raso sou ao olhar pra mim.