Amor Anoréxico
Vem pra mim ser esquelético,
Mostra suas curvas de ossos,
Quero esses sulcos patéticos,
Debulhando esses salientes destroços.
Essa boca de pele murcha,
Como o restante que é sugado,
Chupada feito forma que não se usa,
Um ser se semblante magro.
Esses seios que pendem caídos,
As costelas dando relevo mórbido,
Os joelhos como bolas num trilho,
As falanges expostas, vales notórios.
Sua cadaveria prenuncia a morte,
Fecha a boca por querer,
Muitos morrem de fome por má sorte,
Mas você deseja esse sofrer.
Mostra essa arcada dentária,
Nesse crânio bem delineado,
Provoque pânico, seja magra,
Definhando passo a passo.
Deixa eu sentir sua ossatura,
fazer suas protuberâncias de mapa,
Cartografar essa hedionda figura,
Ver nessas órbitas fundas, lágrimas.
Seus cabelos ainda resistem,
Feito de corpos enterrados,
Muitos desesperados insistem,
Para que seu "mal" seja tratado.
Mas você é rebelde até os ossos,
Nãovai se entregar ou antes etregar-se toda,
Suas cavidades explorarão locais antes inóspitos,
Minguando feito uma lua que não mais ressoa.
Suas covas são fundas,
Crateras férteis,
Pequenas tumbas,
Corpo mais leve.
Musa do Terceiro Cavaleiro do Apocalipse,
Seu traje é negro como as olheiras dessa face,
Sedutoramente horrenda enquanto existe,
Toca com graça e provoca arrepio nos lares.
Vamos dançar com cuidado,
Não quero que se desfaça em meus braços,
Quero ver flutuar seus abissais traços,
Nosso ritmo será de amores desesperados.
Tanta comida, mas rejeita a abundância,
Pede pra si o sofrimento dos famintos,
Encarna a miséria com sua desesperança,
Mostra aos glutões a sua antítese, com afinco.
Em alguns momentos,
Penso que é marionete,
De tão finos teus membros,
Parace manipulada, inerte.
Depois que a sepultarmos,
Saberemos que já foi cadáver em vida,
Definhou até não mais supotarmos,
Padeceu para nos presentear com essa agonia.
Avatar da mais sombria abstnência,
Nem dará muito o que comer aos vermes,
Já anunciava a cada hora um devir de ausência,
Saiba que um amor sofrido assim, jamais se esquece.