Febre

(O limite entre o macabro e o real)

No calor eu me derreto em devaneios

Porque arde em pele fria este tormento

Que não sabe me atormenta se mereço

Em vã fragilidade em vil momento

Desta vida que se arrasta sem apreço

Então me alucino onde me perco

Em busca da resposta incessante

E se cansa no opróbrio em que me encontro

Pois em frente do momento delirante

Já não sei mais se vivo ou se morro

Sei cada angústia guarda em si o seu motivo

Porque sofre e porque se angustia

E nasce em fértil terra pra durar

O tempo necessário em que ardia,

Esvai-se como pétala a vagar

Enquanto o ar se acelera neste peito

Quente, não mais que a esperança

Assim o coração enfim responde

Batendo então mais forte do que pode

Embora saiba não ser mais que uma querença

Ó, efêmero sopro que me assombra

Tu és o meu consolo e me conforta

Porém ao mesmo tempo o meu susto

Quando pende para a morte que se aporta

No cais de minha vida qual um luto

O que é esta vil temperatura

Que, destemperada, me acolhe

Mas enfim por tão sinistra em véu se enche

Fazendo do suor que não se para

De cair nesta fria desventura?

Não, não quero ser mais um nesta história

Simplesmente sendo mero figurante

E sim o final protagonista

Mesmo em drama que se arrasta decadente

No desfecho em que sucumbe o artista

Pensamos estar sós na solidão

Mas mesmo solitários somos muitos

- Por fora nossas peles que se douram

Enquanto embelezamos como doutos -

Co'esses vermes que por dentro nos devoram

Não há tão pessimismo na palavra

Mas a realidade que transforma

As nossas lindas células de cor

Um dia como mórula sem forma

No outro degenera em tumor

Ó vida que passeia no infinito

És bela, não incólume, errante

Quando os minutos regressivos

Achegam-se no ser que, por mais forte,

Só resta prosseguir com os que estão vivos

Por que corremos, acalma, coração

E viva intensamente tua alegria

Pois saibas que tu tens em ti contados

Não somente os teus anos devotados,

Cada um dos batimentos do teu dia...