- POEMA ORGÂNICO - OU - POLITICAMENTE CORRETO -
Nesses tempos de exigências especiais,
tempos de ser politicamente correto
em todos os momentos,
decidi fazer um poema orgânico,
sem cacofonias, nem vícios de linguagem,
sem agrotóxicos ou chuva ácida,
em estilo livre, sem a discriminação da métrica,
pelo que, obviamente, desisti de dar-lhe a forma de soneto.
Um poema, enfim, para ser lido
por toda gente,
de todas as opções sexuais
- (todas as seis bilhões e meio existentes,
uma para cada habitante do planeta) -
gente de todos os credos,
de todas as raças e tamanhos:
índios de tênis adidas e óculos escuros,
mulatas faceiras, passsitas de escolas de samba,
negros de 0,01 a 99,99% de pureza,
judeus com crise de identidade,
militantes petistas,
feministas desvairadas,
crianças abandonadas,
travestis, sem teto, estelionatários,
Terroristas xiitas,
Machistas desencontrados do amor,
carecas, coxos e desdentados,
seu esquecer um segmento social sequer,
a todos incluindo, a todos satisfazendo,
sem qualquer forma de preconceito,
a não ser o pior de todos,
o de a todos procurar atender.
E, se depois de tanto empenho
ainda restar no meu poema,
um leve toque de homofobia,
um resíduo de gordura trans,
quantidade excessiva de colesterol,
palavras dúbias ou vãs,
excesso de besteirol,
algo dito ou subentendido
em seus versos desconexos,
confesso a total incapacidade,
desse meu sonho utópico,
dessa minha tentativa frustrada
de reunir, num ato heróico,
as palavras, hoje em dia encarceradas.