TRILOGIA "FORTUNA DOMINATRIX MUNDI": A ÚLTIMA CARTADA


I – Arcanos Menores: Damas de Variados Naipes (As Jogadoras).
 
As terríveis Parcas
E a duvidosa Fortuna
Em um grande Salão de Jogos
Tem convertido minha vida,
Onde mulheres de toda sorte jogam,
Divertem-se, com meu coração brincam
E à deusa Victoria brindam
Minha derrota e minhas desditas!
 
Acompanhantes, cortesãs, meretrizes,
Vedetes, “mulheres da vida”, felizes
Aguardam absortas a última cartada,
E esperam ávidas por fichas,
Ora regaladas pela Fortuna,

Ora pelas Parcas,

As únicas que dão as cartas

Nesse grande jogo carteado

Com baralhos de Tarô
– sem os Arcanos Maiores,
como gostam as deusas
ao invés de usarem um baralho comum –
Onde todas se divertem apostando
Minha felicidade e disputando
Como troféu meu coração!

 
Sentem-se todas poderosas
No luxuoso salão,
Afortunadas, vitoriosas,
E se esquecem
De quem são as Parcas:
Com ganância e imprudência,
Entram no jogo com as parcas
Fichas que tem, cobiçando
Os altos cacifes em poder das deusas,
Que retém meu quinhão na vida
Por pura crueldade e capricho,
Para seus ledos jogos de cartas
– pelo conluio entre a Fortuna
e as odiosas Parcas,
em parcas condições tenho vivido,
posto que o sorteio é combinado!
 
Todas se identificam
Com as mais valiosas
Cartas da corte
Do meu embaralhado
E confuso coração
(Dama de Copas
E Dama de Ouros),
Mas não passam
De Damas de Paus
(bastões e estacas)
E Damas de Espadas
(apunhalam entre as espáduas)!
 
Por muito tempo jogou
A Dama de Copas com minha vida
E dona foi do troféu até o dia
Em que ao mármore o lançou
E o salão abandonou;
Não está mais autorizada
A adentrar ao nobre recinto
E do baralho foi separada em definitivo
– por mim sempre é descartada
quando tenta voltar ao jogo para brincar
com minha mente embaralhada!
 
A Dama de Ouros está em jogo
Mas não joga com minha vida
Ou disputa meu coração em jogos,
Pois as cartas boas não entram no salão
Para fazerem parte do jogo sujo
Das Irmãs do Destino,
Embora essa nobre dama
Lute por ele com valentia
E devoção em busca do amor;
E ainda que as deusas
Sempre tentem descartá-la,
Oculto-a sob a manga esquerda
– é meu trunfo contra as Parcas!
 
E ao final receberá os favores
De Victoria e ganhará o troféu,
Sendo coroada como a nova
E legítima Dama de Copas,
Pois diferente da antiga usurpadora,
É de nobre linhagem e merecedora
De voltar ao trono que lhe pertence!
 
Essa bela e nobre dama
Reúne o que há de melhor
Em todos os quatro naipes:
Lanças (Paus) e espadas
Para lutar pelo meu coração,
Já que tem um (Copas) de ouro
Que enobrece seu seio!
 
Sendo assim, como um Curinga,
É a carta mais completa e importante
Do baralho e me levará à vitória
– Victoria é sua protetora!
 
 
II – Arcanos Maiores: A Roda da Fortuna (As Cartomantes).
 
Para me roubarem o alento
E me fazerem do jogo da vida desistir,
Vestem-se as Parcas
Com lúgubres túnicas,
Dando claros sinais
De suas sádicas intenções,
E novamente jogam Tarô para mim
– hábito diário e sarcástico
de se divertirem e fazerem escárnio
lendo minha sorte,
como se não bastassem
as longas noites de carteado
apostando a minha vida,
e disputando meu coração!
 
Como sempre,
Não me permitem tirar as cartas
E as colocam uma a uma
Sobre a negra mesa,
Formando um pentagrama invertido.
 
A primeira carta sempre
É o Arcano X invertido,
E todas as demais cartas
Saem igualmente orientadas
– a Fortuna assiste à macabra consulta
girando sua grande roda,
rindo ao ver sua traiçoeira carta!
 
Depois tiram o Arcano XII,
Como se eu devesse suportar
Resignado os sacrifícios
Que me são impostos por elas,
Como se fosse justo o destino
Tecido pelas deusas no áureo
Manto de minha vida terrena!
 
Em seguida tiram um a um
Os arcanos XVI, XIII e XV,
Deixando bem claro o destino
Que cruelmente me reservam!
 
Nunca colocam sobre a mesa
A carta da corte mais valiosa,
A Dama de Ouros,
Pois segundo o oráculo de Febo,
Representa a felicidade e a riqueza
No matrimônio e na vida
Pelas mãos de uma dama
(os favores que esperava da Fortuna)
– não sabem elas que guardo
esse trunfo em minha manga!
 
Às vezes penso que deveria viver
Como o louco do Arcano XXII,
Vendo-o, talvez, como o Arcano 0,
O ponto zero da jornada em outro nível,
O início de outra etapa
Que pode ser um recomeço,
Mais leve, mais livre, mais despreocupado,
Mas dependeria muito dos favores da Fortuna
E acho que por isso nunca tiro essa carta!
 
Quando na mesa de jogo
O Destino a mim se apresentou,
Acompanhado pela Fortuna,
Tive ainda a esperança
De um jogo excitante e justo!
 
E quando virei o jogo
Com a Dama de Ouros,
Um sorriso o deus insinuou,
Demonstrando fascínio pela carta,
E do jogo se desinteressou,
Despertando ainda mais interesse
Na ninfa que assistia a partida,
Pois ama reviravoltas,
Entretém-se com altos e baixos,
Gira afortunada sua roda,
Fascinada ao assistir o mortal
Que cai por um lado
Enquanto pelo outro,
Outro é exaltado!
 
Então, retirou-se do salão o Destino,
Mas com alegria me disse a Oceânide
Que o Jogo da Vida apenas termina
Quando o fio da vida é pela Morta partido
Na lutuosa e derradeira partida;
Que o jogo apenas estava começando
E que era hora de tentar novamente
A sorte na grande Roda da Fortuna!
 
Girou a roda sem a venda:
Pude ver o brilho em seus olhos,
Mais sorridente que Vênus!
 
Ao terminar o giro,
Anunciou com grande júbilo
Meu grande prêmio:
Conheceria as irmãs do Destino
– disse-me que era um grande privilégio
a um mortal poucas vezes concedido!
 
E em um bater de asas
Atravessou lépida a porta
Em busca das temíveis Parcas:
Outra vez, minha sorte mudava!
 
Preferia quando o Destino
Era apenas UMA força invisível
Junto à volúvel Fortuna
– agora são TRÊS, por sua culpa!
 
A Fortuna se revelou
Uma inimiga oculta e traiçoeira
Ao girar sua roda sem a venda
– a trama se desvenda!
 
Estou cansado de ver
Meu destino em baralhos,
Em jogos de cartas,
Em jogos de azar,
Onde a Fortuna reina
Dando as cartas em mãos
De boa ou má sorte, para mim, sempre má;
Estou cansado de depender dos seus favores
– para mim, sempre é desfavorável!
 
Estou cansado de ser usado
Para a diversão das insensíveis mortais
E das cruéis imortais!
 
Estou cansado
De ser apenas uma carta
No jogo da vida
Ou no baralho de uma mulher;
Cansado de vê-la embaralhada
E distribuída a qualquer uma
– preciso girar a grande roda
a meu favor, virar esse jogo!
 
Deuses versus homens,
Imortais contra um mortal;
O jogo é muito desigual,
Então me permitam um ardil
Com o meu maior e único trunfo:
A poderosa Dama de Ouros
– minha ÚLTIMA CARTADA!  
 

Julia Lopez

13/05/2013
 
 
Foto: Arcano X – “A Roda da Fortuna” do Tarot Mitológico.

Nota sobre o áudio: Fortune Plango Vulnera e O Fortuna, de Fortuna Imperatrix Mundi (primeira parte da Cantata “Carmina Burana - Cantiones profanae cantoribus et choris cantandae”, de Carl Orff). Essa primeira parte da obra do Compositor serviu de grande inspiração para o Poema!

 


Visitem meu Site do Escritor: http://www.escrevendobelasartes.com/

 

Julia Lopez
Enviado por Julia Lopez em 14/05/2013
Reeditado em 10/01/2024
Código do texto: T4290324
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