Impenetráveis infinitos
A vida...
já estou quase de saída
mas o amor pulsa tanto assim
que não sinto coragem
de me despedir de mim.
O que ainda me compõe me aninha
o que descompõe me azucrina.
Os zunidos
são sentidos
até dentro dos ossos,
que envelhecem o que me habita,
a pele grita.
O tempo agita o coração
que se arrasta pela escuridão
e meus passos escorregam para baixo.
A terra me aguarda.
A vida fica à deriva do que faz sentido.
Restam impenetráveis infinitos
e o finito deságua no oco dos gestos.
Veias abertas derramam o que já tive
e o corpo se desvia
no vento sem rumo da ventania.
A carne e o poente
frente a frente
ficam na memória.
O sol posto
a vertigem no rosto.
O que foi eterno
esconde-se nas paredes do desabrigo
o trigo
molda o pão do que passou.
A juventude não verdejará nunca mais.
O que se foi não mais se vê
mas ainda me sinto
com a graça de ter sido alguém.
Vivo dentro de um silêncio palpável
que me leva à escrita
e me concilia com o romantismo.
Vivo uma indagação irrespondível,
sofrível
é a vida depois do cansaço,
o que faço
de uma vida que se esquiva?
Nuvem na visão dos olhos,
metas que se dissolveram
como gelo sem destino,
o hino
que devia ser cantado chora.
Agora
o sol toca o avesso
do que não mais empolga
e o livro fica de folga.
Meu suor é o choro
de tudo o que se foi na ventania.
A aragem que me toca é anêmica
já não tem sangue.
26 de julho de 1934.
Só o que deixo no papel
sobreviverá.