O sonho sonhado pelo sonho

Tenho tentado não esquecer

Que você é apenas um sonho

E como tal é de impossível viver

Mas é real que se o é,

É antanho também

O sinto, e sempre veio vindo comigo

Desde que numa noite chuvosa

Olhos como os meus e os seus

Viram a mim neste mundo nascer

Sabe, tenho tentado me convencer

Dos princípios basilares que me sustentam

Aquela linha tênue, muito frágil

Que separa a sanidade do enlouquecimento

Isto é, não interferir com mãos materiais

No mundo onírico, distante e perto

Dois mundos, duas coisas controversas

Que se digladiam sempre no meu pensamento

Se considero o sonho como o que considero

Não posso desejar materializá-lo

Posto que sonho é sempre sonho

Realizá-lo, é cometer o crime de matá-lo

Se levo em conta que o desejo

É uma força bruta, não cristalizada

Como posso então desejar algo

Como se do etéreo quisesse modelar

Em matéria mas densa que o chumbo

Ou o mármore

O que só existe por que quis que existisse

E apenas em mim?

Tenho tentado não esquecer

Que você

É apenas um sonho

Uma visão que me ocorreu em sono profundo

Que o mundo, este mundo escombroso,

Que há e é dentro de mim

Pode ser consertado

Reorganizado

Como se houvesse esperança

(uma voz ao ouvido do moribundo...

"você vai viver...")

De que essa dor que montou em mim

Pudesse talvez não ter um fim,

Mas em fim encontrasse

A fonte, que milagre!, De sua natureza oposta

E a dor com a antidor

Num encontro constante

Não mais existissem momentaneamente

O que me permitiria respirar mais profundamente

E te ver muito mais claramente

Com esses olhos já cansados

Que não percebem a vida comumente

E deitar-me em qualquer lugar

Agradecido de haver-te encontrado

E dormir ali, muito profundamente,

E sonhasse que te encontrasse

Como tenho dito até agora

E isso se repetisse eternamente...

Ah, tenho tentado não esquecer

De que

Apenas um sonho é o que é você...

Sebastião Alves da Silva
Enviado por Sebastião Alves da Silva em 19/06/2008
Reeditado em 19/06/2008
Código do texto: T1040873
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