Sextilhas de Frei Tas
I
Certo rei chamou doutores
Para curar seus humores
Que andavam todos azedos
Por discutir com seu ego
De dia ficava cego
De noite sentia medos
II
Deu curandeiro opinião
“Vós tendes no coração
Descompassadas batidas”
O mago disse “a cabeça
Faz com que tudo aconteça
Tendes que tomar medidas”
III
O bruxo culpou “os bofes
Andam maus porque os cofres
Estão só pelas metades”
Salientou velho doutor
“Se ao coração falta amor
Existem contrariedades”
IV
A majestade se exalta
Grita “amor nunca me falta
Pois tenho muitas mulheres
Tenho riqueza de sobra
Até meu tesouro dobra
Conteste-me se puderes !”
V
Todos se quedaram quietos
Porque muitos insurretos
Pararam na guilhotina
Decidiu o soberano
Por todo resto do ano
Desistir da medicina
VI
Passa o tempo o rei piora
Há dias que tem melhora
Mas de noite é um terror
De nada adianta carinho
Vivendo a vida sozinho
Curtindo seu dissabor
VII
Cientistas de toda parte
Malabaristas da arte
Tentavam o rei curar
Esculápios de outros cantos
Benzedeiras de quebrantos
Conseguiam lhe irritar
VIII
Veio então velho andarilho
Que lhe disse “pobre filho,
Ouça-me com muita calma
Na Terra a maior riqueza
A verdadeira realeza
É aquela que vem da alma”
IX
Pousou-lhe a mão na testa
Disse “Em tempo que vos resta
Refazei grandes mudanças
Quebrando o vil preconceito
Pra começar, vos receito
Distribuir vossas heranças”
X
“Aceito e me humilho
Mandai chamar cada filho
Repartir tudo não tardo
Darei bastante pra eles
Só não darei para aqueles
Que o povo chama bastardo
XI
Para que ninguém se zangue
A todos irmãos de sangue
Muitas terras doarei
Parte maior para mim
Pois terei até o fim
A majestade de rei”
XII
“Eu vos digo, majestade,
Deveis fazer caridade
Pra viver mais confortado
Pois todos bens materiais
Meros valores reais
Não tem valor do outro lado”
XIII
“Escutai um pobre velho
Que busca no Evangelho
As claridades da luz
Vos conto tudo que sei
Da triste história do Rei
Que pereceu numa cruz”
XIV
Principiou então narrar
Desde a noite começar
Feito epopeia em trova
Desde os tempos que os judeus
Sempre esperavam que Deus
Lhes trouxesse a Boa Nova
XV
Em muitas noites e dias
Toda a obra do Messias
Foi pelo velho contada
Muitas vezes o rei chora
Notou-se grande melhora
Já quase sentia nada
XVI
Um dia sentiu-se novo
Mandou chamar todo povo
Para seguir seu exemplo
Fez obras de caridade
Distribuiu sua herdade
Mandou erigir um templo
XVII
Todo final de semana
O velho ao povo explana
O que o Cristo fazia
Naquela imensa região
Então todo cidadão
Bom Jesus reverencia
XVIII
Um novo povo cristão
Cria amor no coração
Todo bem que a alma almeja
Pois cada homem de bem
Que aprendeu dizer amém
Vive a verdadeira igreja
XIX
O cristianismo avança
Trazendo luz, esperança
Aos corações novo brilho
Dissipa-se o segredo
Do rei do humor azedo
Quem era o velho andarilho
XX
Pregador do novo ensino
O velho Frei Tas Aquino
Fez o mundo mais feliz
Encantando com sextilhas
Ele alegrava famílias
Foi discípulo de Assis.
(Frei Tas é meu heterônimo medieval)