Fenômeno

Ó flama d'audácia, que em meu peito lavra!

Ímpeto que às raias me há-de levar,

Do desvario a transpor a palavra,

Onde a mente sã vacila em seu lugar!

Entre a sombra e a luz que desagrava,

Um fio de ser, prestes a se quebrar.

Em mim, que neste engenho desta raiva,

Ah, falta pouco, um triz, um sopro de ar.

Para que o instante, em seu fatal aprumo,

Traga a lufada, a força inesperada,

Que zombe da face, do néscio resumo,

Desta vã matéria, parva e embotada.

Assim navego, em rio que me assumo,

Qual igarapé por ínvia se torna o nada

Sem da alheia estima buscar a sina,

Pois mora em minha alma a luz apagada.

Nesta pele trago a força que me anima,

Pai, esposo, um vate de outra nação.

Assim caminho, sob sol que castiga,

Ou sob o frio de névoa em escuridão.

Fenômeno esquivo à sombra inimiga,

Que espreita, agora, sem me compreender.

Pois trago a luz que a escuridão mitiga,

Um cantador das matas a florescer!