Temor de poeta
O que mais temo é esquecer o meu talento
Perdê-lo aos poucos pelo desuso
E permitir que uma inércia tome conta de meu dom
Receio
Cair na utilidade prática da vida comum
Enquanto minhas razões sofrem queda
E toda a sensibilidade entra em latência
Não pode ser esse o destino de um poeta
Nem escrever com hora marcada
A arte é sem-tempo, mas jamais anacrônica
A palavra precisa ser dita, sob pena de sufocar
O pensamento perde-se no limbo de tarefas
Quando o poeta adia a sua linguagem
Escrever é como um desejo
Padece de impulso se não for estimulado
E quanto mais se exercita, maior a pretensão
Escrever é como o beijo de um apaixonado
O primeiro tem um ardor que ensejará outros
E os que virão, abrem caminhos para os próximos
Sem-fim literário
Faina bela que lapida o bruto
Em joia rara vestida de letras
Palavras-rubi e frases de safira
Brilham na escuridão da abstinência
Iluminando o poeta em ausência
para que retorne um dia quem sabe
quando a chama estiver se apagando
e o relembre do encanto que o emana
vencida a superfiicialidade paisana
que um dia o fez duvidar
fruto de olvidar
Sem óbvio
Só oblívio