Crítica à crítica
Feliz é a obra que rechaça os comentários dos que se auto proclamam profundos entendedores da alma humana refletida em músicas, palavras, pinturas ou em qualquer outro veículo de subjetividade, dificilmente reconhecido como legítimo por aqueles que dizem dominar a teoria do terreno fértil imaginativo. Nada se torna obra-prima sem uma procissão de comentários negativos, pois o que torna uma produção humana grandiosa que atravessa os séculos e os paradigmas, é sua ousadia diante da concepção convencional de Arte, postumamente reconhecida com seu devido valor. Sim, Arte com A maiúsculo, já que estamos falando de estética, poesia e emoção no sentido mais amplo que o termo pode expressar. A partir da noção de que os sentimentos regem o fazer artístico e participam ativamente da leitura e da compreensão pessoal do telespectador sensível e disposto a doar-se àquilo que uma boa obra pode proporcionar, questiona-se os critérios de avaliação de uma obra do ponto de vista técnico. Até que ponto importa uma tendência, se as lágrimas são a prova viva de que o ser foi tocado? Quais parâmetros se usa para taxar uma obra no mercado se a mesma remonta uma lembrança preciosa e de inestimável valor? A régua que mede a delicada apreciação que só pode ser encontrada nos sentidos e no despertar de uma memória evocada por traços, letras ou sons não pode ser utilizada com o fim único e seco de se esperar informações que não agregam valor sentimental à obra, tida unicamente como produto final grosseiramente categorizado, o que se distancia do elemento fundamental que faz da Arte ser o que é, guardando-a e constantemente aguardando-a. É fato que nem tudo que se pode ver ou sentir tem um valor clássico que possa se incluir na lista de objetos afortunados, visto que apesar das infinitas interpretações possíveis, não é cabível desapropriar o material desprovido de sentido de seu campo vazio de sensações suscitadas. Tal viés muda caso o objeto em potencial de aceitação tenha sua função modificada e seja analisado a partir da perspectiva simbólica de outra circunstância temporal, o que altera seu rumo analítico por meio de uma problematização que a revisão e a ressignificação permitem, delineadas pelo tom de maturidade que o progresso das percepções nos exige. Ao invés de alcançar disposição para julgar, o meio crítico tem a capacidade de canalizar sua veemência para o ato de produzir aquilo que ela tanto avalia com a frieza de um professor severo que pouco considera a trajetória e a história de vida do estudante no momento em que o concede uma nota escolar. A diferença é que a crítica apenas ensina após publicar seu teor quantitativo aos leigos, em uma necessidade cruel de se firmar como conhecedora dos artifícios da Arte, fundamental para a sobrevivência desse ramo de árbitra da beleza. Afirmando-se estudada, entendida e atualizada no assunto que lhe compete, a crítica somente fantasia-se de aparências e não suporta que nada antes dela atinja a perfeição. Assim, seu trabalho não complementa a Arte nem visa ao aprimoramento na direção do ideal, mas opõe-se ao seu próprio objeto de estudo, em uma infeliz contradição de sua rota primordial.