Nas águas da purificação

Me banhei nas águas de Oxum vestida de silêncio e solidão, precisava estar cercada pelo nada para poder sentir. Um nada que também era tudo, berço da criação. Me senti no útero da mãe Terra, amada e protegida por cada suspiro que as árvores sagradas expressavam através do estalar dos galhos que dançavam com o movimento do vento. Foi uma experiência mística ser abraçada pelo invisível, acolhida pelas mesmas águas que escorriam das minhas represas internas abarrotadas de emoção.

O alívio de finalmente poder abrir essas comportas foi imenso, mas não o suficiente para permitir toda a vazão de lágrimas em segurança. O meu corpo é feito de carne, mas essa carne não sustenta o peso de um rio inundado de dor e ilusão.

Não basta chorar, é preciso reconectar memória e sentimento e essa é a parte mais dolorosa, mas ainda assim dói menos do que fingir que não doeu. Engoli tanto o choro que quase morri engasgada e, agora, quase morro também para desengasgar.

Minha presença dobrou a queda d'água, a quantidade de água que caia da cachoeira era proporcional a quantidade de lágrimas que saia de mim. Líquido o suficiente para nutrir o coração dos amargurados. Purificação necessária para abertura de novos ciclos e caminhos. Sigo mergulhando cada vez mais profundamente em mim, na expectiva de encontrar o baú que esconde também os meus sorrisos.

Rafaela Andrade
Enviado por Rafaela Andrade em 26/08/2021
Código do texto: T7329281
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