Sentir para recomeçar

Não sei como chorar essa represa de lágrimas que está empoçada em meus olhos, parece que quanto mais eu choro, mais eu sinto vontade de chorar. Minhas pálpebras estão inchadas, minha cabeça dói, mais ainda tenho sentimentos a liberar. Tenho um choro catártico a espreita de desaguar, mas não sei como permitir que ele flua por mim e purifique meu ser, parece que meu corpo não aguenta.

São tantos lutos para chorar, tanta dor, tanto sofrimento que nem sei por onde começar. Eu olho para o vazio, sinto a angústia que se instala em meu peito, mas não consigo atravessar a muralha de mágoas e ressentimentos que obstrui a represa de desaguar. Preciso purificar minhas emoções, deixar ir esse passado sombrio que tanto tirou de mim. Não sei ao certo como tirar a mochila de pesos acumulados dos meus ombros e seguir leve como uma borboleta bailarina que dança pelo ar, pousa nas flores e se refresca nas águas gélidas da cachoeira. Quero me aconchegar nos braços de minha mãe Oxum, deitar em seu colo e relaxar sem pressa, sem interrupção, sem repressão.

Espero por esse recomeço há tanto tempo que parei de contar. Tanto tempo que não sei como sentir ou me comportar. A vida continuou, evoluiu, eu parei num tempo que nem sequer existe mais, a antiga eu não existe mais, mas algo em mim ainda não atualizou para o agora.

Romper barreiras mentais, preconceitos, limitações para ser, de um jeito purificado, não contaminado pelos traumas do passado que não cabem mais no presente. Despertei desse looping infinito de repetição e perpetuação de sofrimento, mas despertei tb para as sombras da minha ancestralidade que é densa, castradora, abusiva e isso dói, reconhecer que por tempos agi assim e hoje consciente do que fui, escolho fazer diferente. Um diferente que não sei ao certo como construir pq minha conexão com meu eu mais profundo ficou fragmentada por conta dessas dores que não sei como sentir.

Estou sozinha, não tenho nenhum ser humano ao meu redor capaz de me acolher, tá todo mundo ensismemado na própria dor. Só tenho a mim mesma, a espiritualidade, a arte e à Terra, que é tão generosa comigo mesmo diante do meu sentimento de não merecimento. Tenho muito, mas me falta um singelo abraço. Que eu possa ainda encontrar acalento para a minha alma que já foi tão agredida em sua sensibilidade, que eu possa simplesmente sentir.

Rafaela Andrade
Enviado por Rafaela Andrade em 13/08/2021
Código do texto: T7320270
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