PENSAMENTOS NA MADRUGADA
Houve um tempo em que achava que teria saudade de mim mesmo, especialmente daquilo que não fui, mas desejei ser. Saudade do sonho e de tantas possibilidades. É coisa que remete a momentos de busca e efervescência, de fantasias e arroubos, típica de certa inquietude juvenil, altamente positiva, mas passageira. O futuro foi acontecendo, a vida fluindo e, hoje, não tenho mais essa saudade e, nem de longe, frustração pelo fato de que certos anseios não foram contemplados ao longo do tempo. Acontece com quase todo mundo. Achei que devia compartilhar este estado de espírito, que não significa conformismo ou rendição, mas amadurecimento e autoconhecimento. A conquista maior do homem é a de paulatinamente adquirir consciência de sua individualidade: sua real vocação, suas mais poderosas tendências, verdades, prazeres e limitações. Claro que um ou outro desgosto sempre desgarra, mas não deve atormentar. Ninguém é completo. Tirante os defeitos de temperamento, nossa eterna sombra, sentir-se em paz é grande passo no caminho da felicidade. Viemos ao mundo para resistir as tristezas inevitáveis da jornada, jamais para sermos uma tristeza a mais ou uma estrondosa queda. Existem dores que não estão a nosso alcance impedir, salvo aquela imperdoável de extraviar a própria identidade e definhar debatendo-se na escuridão.