Ja não me lembro mais porque eu sai de casa
Já não me lembro mais porque eu sai de casa.
Eu lembro que estava escuro, difícil e doentio. Precisei ser socorrida, arrancada. Eu tinha recem parido, Aloma tinha tres meses quando sai, e meu mais velho, meu pequeno mais velho tinha acabado de fazer cinco de mão cheia. Nao faço Idéia o quanto eles sofriam. Nunca falaram essa língua do portugues chorado. Criança é criança: so bate, briga e chora. Isso sim, aconteceu depois quando eu recem tinha saído.
Mas eu lembro de estar sufocada e um desespero me bater a ponto de eu, apaixonado por um outro, sentar num gramado, num festival de jazz, com minha saia colorida, ele tinha me chamado "você é muito linda", e, eu, fatalmente casada, para sempre gaiolada, eu nada podia fazer, nem gritar nem correr, então sentei naquele gramado ao som de um muito reggae mesmo africano e chorei uau! por todas as paixões que eu tinha, e eram muitas, e nada podia fazer.
Caramba. Disso eu lembro, que chorei.
Depois outra, eu queria ser mais livre, mais, mais livre. Na verdade eu queria ser eu.
Eu pensava pra que eu vim ao mundo? Pra que? Devia ter alguma coisa em especial para eu fazer. Qualquer coisa que precisasse de mim, que carecesse das habilidades que so eu tinha, que fosse....que simplesmente fosse minha.
Por isso também eu sai. Me sentia um pouco traída. Trabalhei por dez anos numa roça que na verdade nao era minha. Mas tudo bem.
Tudo bem nada. E também, eu sonhava em poder dizer a verdade de tudo o que eu sentia. Ir pra onde eu queria. Fazer o que me desse na telha. Chegar em casa a hora que fosse, livre de qualquer cara feia. Queria que ser livre fosse coisa normal.
Por isso eu sai. Lembrei.