A infelicidade dos últimos homens

Naqueles tempos não existiam homens e não existiam os conceitos de felicidade ou tristeza. Passaram os tempos e chegaram os primeiros homens todos perdidos no que se referia ao que era felicidade ou tristeza. Vieram os primeiros filhos dos homens e com eles os primeiros ganhos dos homens, logo muitos sentimentos foram criados.

Diante dos primeiros conceitos de felicidade e tristeza surgiram as primeiras escolhas do que fazia sorrir ou chorar. Alguns viviam sorrindo e outros chorando e poucos sabiam realmente qual era o significado, outros discutiam sobre o que era melhor e os primeiros preconceituosos começaram a afirmar verdades que nunca seriam absolutas. Muitos homens morreram e os assassinos não conseguiam mais parar de assassinar apenas para protegerem a própria existência.

Chegou a metade da existência humana e todos dançavam sem saberem da eternidade ou da razão tão banal da simples mortalidade. O meio era sem fim e o fim parecia não mais chegar ao final. Cantavam e dançavam sem alegria, em um ceticismo que causava pavor, principalmente nas crianças que ouviam ameaças bailando no ar.

Com muito esforço por parte de alguns homens de conhecimento conceituaram o caminho da felicidade e também tinham a ousadia de informaram que a tristeza era simplesmente o oposto. A felicidade foi pregada nos costumes e os costumes significavam a felicidade ou a tristeza. Quase ninguém alcançava a felicidade e na infelicidade muitos lutavam para alcançarem a felicidade.

Tinham cânticos para crianças nas igrejas, nas escolas e aos jovens era apresentado o sentido justo da injustiça política. Tudo estava preparado e suportar a dor não era mais ensinado, e superar os obstáculos para que os sonhos individuais não fossem realizados não era mais ensinado. É que agora o sentido moral tinha predominado e qualquer ato de loucura tinha que ser evitado pelo bem da civilização, pelo bem dos homens da felicidade, pelo bem dos homens de conhecimento.

Mal sabiam os últimos homens que eles tinham conceituado a felicidade e infelizmente eram todos felizes. Não queriam mais dançar no abismo, é que a dança levava ao risco e o risco iria acabar com o gesto moral que levou doze mil anos para ser aplicado. Os últimos homens não podiam mais falar, chorar e apenas piscavam quando questionados se eram felizes.

Escritor Joacir Dal Sotto

Joacir Dal Sotto
Enviado por Joacir Dal Sotto em 20/04/2015
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