Memórias Póstumas de uma paixão (III)
Texto III – Por favor, não insista!
Luciana olhou para o céu nublado, suspirou e pensou: essa situação de novo!? Pablo parecia um cara ótimo, carinhoso, tinha um bom papo e o melhor, sabia dançar. Era muito insistente, queria sair em plena terça, quinta, segunda, queria vê-la de qualquer jeito. Ela dava desculpas, ficava off-line e ele prometia que não ia mais importunar. Ela até lhe deu um beijo, para ver se sentiria algo que a motivasse a tentar.
Não conseguia sentir nada, mesmo sabendo que ele era um bom partido. Talvez até fosse a pessoa certa, mas na hora errada. O fato era que ele não a teria, pelas feridas que ela possuía naquele momento e pela incapacidade de brincar com os sentimentos das pessoas.
Tinha receio de estar abrindo mão da felicidade, mas o medo de estar repetindo a mesma história era muito maior. Era sempre assim, de forma cíclica. A paixão não dava certo, o fim era trágico e nesse meio tempo entre se conformar e prosseguir aparecia alguém. Ela contava o relato do relacionamento, os motivos do fim, na ilusão que ele não fizesse o mesmo. Mal sabendo que aquela atenção que mais parecia interesse ingênuo, era a captação de suas fraquezas para atingir seu tendão de Aquiles se necessário.
Então Luciana anestesiava a dor passada, se sentia curada e mais uma vez se entregava. Mas, antes disso o medo da dor a fazia tentar não prosseguir, obter a certeza de que aquele ser teria a paciência necessária para compreender aqueles sintomas comportamentais de um coração que ainda se contorcia em dor. Ele insistia, dizia que compreendia, pedia uma chance para fazê-la esquecer a dor e a enchia de mimos e momentos felizes.
Quando finalmente resolvia enfrentar os medos e prosseguir, quando já estava apaixonada, ele a abandonava. Usava seus defeitos, dores, fingia sofrimento e apenas se afastava. Não atendia aos telefonemas, não enviava respostas às suas trinta mensagens virtuais, dizia aos seus amigos em comum estar sofrendo muito com a sua indecisão e que estava apenas abrindo mão da mulher amada para que ela descubra se o que sente é amor. Um lord.
Luciana podia até culpar aquele homem tão dedicado, carinhoso, bondoso, atencioso e que lindo, um ótimo cozinheiro. Mas ele era perfeito, ela que era a culpada pelo desperdício da oportunidade de finalmente ser feliz. Agora, sozinha e sofrendo, ficava se remoendo, culpando seus medos e sua infantilidade. Humilhava-se, implorava, dizia estar disposta a se satisfazer com restos e sobras, pagar preços altos e fazer sacrifícios, mas ele apenas fingia estar muito magoado.
Aquela linda moça ruiva, de pernas bem torneadas, sorriso iluminado, inteligência ímpar, capacidade única, se sentia um lixo. O tempo passava, e no momento entre se conformar e prosseguir aparecia alguém. Tudo do mesmo jeito, só mudava a raça, a religião, a nacionalidade, o estado financeiro e intelectual, mas a situação era a mesma. Quando menos esperava, a fofoca chegava ao seu ouvido, aquele ser que a deixou com a culpa do fim, já tinha há tempos outro alguém, estava muito feliz em Babylon e você com um mosaico de culpas para lidar.
E começava tudo de novo com a característica única que sempre tinha alguém disposto a insistir. Luciana olhou para o cinza do céu, um belo nublado e suspirou. Lamento Pablo, mas não vai ser possível, por favor, não me ligue mais, não insista mais e compreenda se for capaz. Decidida a se enfrentar e permanecer nesse ostracismo voluntário, decidiu não se entregar mais à chuva, depois de uma pneumonia mal curada. E foi nesse momento que começou a perceber que precisava mesmo era se amar para ser amada.
ano 2011